O abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, devendo ser decretado de ofício pelo juiz

Jurisprudência cobrada na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto e na fase discursiva do TJ/AM, realizadas em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ

O abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever do juiz e direito do devedor a aplicação dos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico entre as prestações, os quais convivem harmonicamente com a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda.

 

Ementa

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO DA APELAÇÃO NA ORIGEM. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RESILIÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO. ILEGALIDADE RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INCIDÊNCIA DOS ÓBICES DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. CUMPRIMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO. REDUÇÃO DA CLÁUSULA PENAL DE OFÍCIO, NOS TERMOS DO ART. 413 DO CÓDIGO CIVIL. DECISUM EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DESTA CORTE SUPERIOR. MODIFICAÇÃO DO QUANTUM FIXADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. REPARTIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA. ALTERAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. RECURSOS ESPECIAIS CONHECIDOS PARCIALMENTE E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDOS.

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, "o relator está autorizado a decidir monocraticamente recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior (arts. 557 do CPC e 34, VII, do RISTJ). Ademais, eventual nulidade da decisão singular fica superada com a apreciação do tema pelo órgão colegiado em sede de agravo interno" (AgRg no AREsp 404.467/RS, Relator o Ministro Antônio Carlos Ferreira, DJe de 5/5/2014), razão pela qual não há qualquer ilegalidade no julgamento monocrático da apelação na origem.

2. Tendo o Tribunal Paulista decidido todas as questões suficientes ao deslinde da controvérsia, não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional, tampouco em nulidade do acórdão recorrido, afastando-se, com isso, a apontada violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015.

3. Verificando que o caso se enquadra nas hipóteses previstas no art. 413 do Código Civil, não há qualquer ilegalidade na redução da cláusula penal de ofício pela Corte local, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça. Precedentes.

4. Com base na interpretação das cláusulas contratuais e na ampla análise do conjunto fático-probatório dos autos, as instâncias ordinárias concluíram que houve irregularidade na resilição unilateral do contrato efetuada pela recorrente Usina Santo Ângelo, devendo incidir, por essa razão, a respectiva multa contratual. Esse entendimento não é passível de modificação na via do recurso especial, em razão dos óbices das Súmulas 5 e 7 do STJ.

5. Na hipótese, considerando o cumprimento parcial da obrigação, correspondente a 60% do que fora contratado entre as partes, o Tribunal de Justiça de São Paulo reduziu a cláusula penal de 10% para 7% do valor total do contrato, nos termos do que dispõe o art. 413 do Código Civil. Esse decisum foi impugnado por ambas as partes, sendo pleiteado tanto o restabelecimento do valor da multa como fixado no contrato (Equipalcool), quanto uma redução ainda maior da cláusula penal (Usina Santo Ângelo).

5.1. Conforme estabelece o art. 413 do Código Civil, há basicamente duas hipóteses que permitem ao magistrado reduzir, de forma equitativa, o valor fixado na cláusula penal, quais sejam, i) se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte; ou ii) se o montante da multa for manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.

5.2. No caso, o valor da cláusula penal foi reduzido em razão do cumprimento parcial da obrigação, pois, conforme restou incontroverso nos autos, do valor total de 20 milhões de reais, foram pagos 12 milhões, correspondentes à integralidade da "primeira fase" do contrato, não se verificando, portanto, qualquer ilegalidade na respectiva redução da penalidade, tendo em vista a correta aplicação da norma disposta no art. 413 do Código Civil.

5.3. Com efeito, "no atual Código Civil, o abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever do juiz e direito do devedor a aplicação dos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico entre as prestações, os quais convivem harmonicamente com a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda" (REsp 1.898.738/SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, DJe de 26/3/2021).

5.4. Da mesma forma, diante das particularidades do caso, também não é caso de se proceder a uma maior redução da cláusula penal, como pleiteado pela recorrente Usina Santo Ângelo, sobretudo porque, conforme ficou consignado pelas instâncias ordinárias, a recorrente Equipalcool chegou a dar início aos preparativos da "segunda fase" do contrato, constando da sentença que os equipamentos referentes à segunda fase já vinham sendo produzidos.

5.5. No particular, conforme já decidido em diversas oportunidades por esta Corte Superior, não se exige a exata correspondência matemática entre o grau de inexecução do contrato e o de redução da cláusula penal. Precedentes.

5.6. Não se pode olvidar, ainda, que o contrato subjacente, de valor milionário, foi firmado entre sociedades empresariais de grande porte, não havendo qualquer assimetria entre as empresas contratantes que justifique uma maior intervenção do Poder Judiciário na avença, além daquela efetuada pelo Tribunal de origem, em decorrência da aplicação de norma cogente (CC, art. 413).

6. Não se revela possível a reforma do acórdão recorrido, no tocante à distribuição da sucumbência, pois "esta Corte Superior de Justiça possui entendimento firmado no sentido de que rever a proporção de vitória/derrota das partes na demanda, para aferir a sucumbência recíproca ou mínima, implica em revisão de matéria fática e probatória, providência inviável de ser adotada, em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ" (AgInt no REsp 1.956.912/DF, Relator o Ministro Marco Buzzi, DJe de 6/5/2022).

7. Recursos especiais conhecidos parcialmente e, nessa extensão, desprovidos, tornando sem efeito a liminar concedida na TP 1.318/SP.

(REsp n. 1.888.028/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 24/8/2022.) Grifo nosso.

 

 Questões da FGV

 

1) A Papelaria ABC foi contratada pela sociedade de advogados XYZ para fornecer cartões de visita, pastas e papéis timbrados com a logomarca do escritório até o final do mês. Constava do contrato a previsão de vultosa multa em caso de descumprimento do avençado, não obstante a natureza e a finalidade da obrigação não justificassem esse montante. Ademais, pelo contrato, a ABC renunciava à faculdade de pleitear a redução judicial da multa. Quando o contrato foi descumprido, a XYZ ajuizou ação em face da ABC pretendendo receber a multa, e a ABC, em sua defesa, não alegou seu excesso manifesto. 

Diante disso, com relação à redução judicial da multa por excesso manifesto, o magistrado: 

(A) pode reduzir equitativamente a multa, pois a norma é cogente e pode ser aplicada de ofício pelo magistrado, contanto que instaure debate prévio com contraditório; 

(B) pode reduzir equitativamente a multa, mas somente se houver intervenção do Ministério Público no processo, como fiscal da lei; 

(C) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, embora ele pudesse conhecer de ofício a excessividade, a norma foi afastada pela vontade das partes; 

(D) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, embora a norma seja cogente, ele não pode conhecer de ofício a excessividade; 

(E) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, além de a norma ter sido afastada pela vontade das partes, ele não pode conhecer de ofício a excessividade.

Gabarito: A

 

2) O Banco Anatos, promitente comprador de um imóvel incorporado por XXX Construtora Ltda., acionou a vendedora reclamando do atraso na entrega da unidade que havia adquirido para construção de sua sede. Antes da sentença, as partes compuseram acordo judicial, que foi homologado pela Primeira Vara de Manaus, prevendo a entrega das chaves em 30 dias, sob pena de multa diária de 1% do valor pago pelo imóvel.

Passado o trintídio, como a construtora não cumpria a obrigação, a instituição financeira passou a executar o acordo, constituindo a ré em mora. 

Depois de 150 dias de inércia, o juízo penhora o valor acumulado da multa diária nas contas da devedora, o que a faz vir aos autos, tempestiva e adequadamente, requerer a redução sob os seguintes fundamentos: (i) já supera o valor do próprio imóvel; e, (ii) embora não negue a inadimplência, ela seria parcial, na medida em que 75% de todas as providências necessárias para a entrega da unidade já teriam sido tomadas. 

Analise o pleito, de maneira justificada, em relação a ambos os argumentos do réu. Ao final, indique sua conclusão, também apresentando e detalhando os conceitos jurídicos envolvidos. Desnecessária a forma de sentença. Considere provados todos os fatos. 

1. A resposta deve ser fundamentada, de modo que a mera referência a entendimento jurisprudencial ou doutrinário, sem justificativa específica, não pontuará. 

2. A mera citação de artigo legal, ou de resposta “sim” ou “não”, desacompanhada da devida justificativa, não garante a pontuação na questão.