DIREITO CONSTITUCIONAL
A responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave (evidente negligência profissional na apuração dos fatos). Nos casos de assédio judicial a jornalistas, a parte ré poderá solicitar a reunião de todas as demandas judiciais para serem julgadas no foro de seu domicílio.
“1. Constitui assédio judicial comprometedor da liberdade de expressão o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou o efeito de constranger jornalista ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa;
2. Caracterizado o assédio judicial, a parte demandada poderá requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio.
3. A responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave (evidente negligência profissional na apuração dos fatos)."
"A responsabilidade civil de jornalistas, ao divulgar notícias sobre figuras públicas ou assuntos de interesse social, só ocorre em casos de dolo ou culpa grave (manifesta negligência profissional na apuração dos fatos), não se aplicando a opiniões, críticas ou informações verdadeiras de interesse público."
ADI 6.792/DF e ADI 7.055/DF. Relatora Ministra Rosa Weber, relator para acórdão Ministro Luís Roberto Barroso. Julgamento finalizado em 22/05/2024. Informativo nº 1.138 do STF.
Afronta a igualdade material de gênero, a fixação de critérios idênticos para a aposentadoria de homens e mulheres policiais civis e federais, conforme previsto pela Emenda Constitucional nº 103/2019
Desde a redação original, o texto da Constituição Federal de 1988 contempla requisitos diferenciados para fins de aposentadoria dos servidores públicos, na esteira das medidas destinadas à realização da igualdade material de gênero. No bojo da EC nº 103/2019, com a adoção de redutor temporal menos elastecido — três anos de diferença dos parâmetros aplicados —, o legislador constituinte derivado igualmente observou a diferenciação de gênero para aquela finalidade e, mesmo para o Regime Geral de Previdência Social, houve a fixação de parâmetros mínimos adequados a homens e a mulheres.
Em juízo provisório, próprio das tutelas de urgência, confrontados os preceitos direcionados a policiais civis e federais da EC nº 103/2019 com o regramento geral por ela introduzido e considerada a praxe constitucional, não se vislumbra justificativa suficiente para a imposição de exigências de aposentação idênticas a ambos os sexos ou desprovidas de proporcionalidade.
Assim, encontram-se presentes os requisitos para a concessão parcial da medida cautelar, pois: (i) há plausibilidade jurídica no que se refere à alegação de afronta ao vetor constitucional da igualdade material de gênero na fixação de critérios de aposentação de policiais mulheres civis e federais implementada pela Emenda Constitucional nº 103/2019; e (ii) há perigo da demora na prestação jurisdicional, consubstanciado no potencial de a incidência da disciplina impugnada causar dano irreparável ou de difícil reparação, ao dificultar ou mesmo impedir a aposentadoria das policiais civis e federais.
ADI 7.727 MC-Ref/DF, relator Ministro Flávio Dino, julgamento virtual finalizado em 24.04.2025 (quinta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.174 do STF.
A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade
“A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade."
RE 1.211.446/SP (Tema 1.072 RG). Relator Ministro Luiz Fux. Julgamento finalizado em 13/03/2024. Informativo 1.128 do STF.
É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa
“1. É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado.
2. O ajuizamento da execução fiscal dependerá da prévia adoção das seguintes providências: a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.
3. O trâmite de ações de execução fiscal não impede os entes federados de pedirem a suspensão do processo para a adoção das medidas previstas no item 2, devendo, nesse caso, o juiz ser comunicado do prazo para as providências cabíveis.”
RE 1.355.208/SC (Tema 1.184 RG). Relatora Ministra Cármen Lúcia. Julgamento finalizado em 19/12/2023. Informativo nº 1.121 do STF.
Norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União
É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional (CF/1988, art. 22, XXIV) — lei estadual que veda a adoção da “linguagem neutra” na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas e privadas, assim como em editais de concursos públicos locais.
ADI 7.019/RO, relator Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 10.2.2023. Informativo nº 1.082 do STF.
Não viola a Constituição a previsão legal de imposição das sanções administrativas ao condutor de veículo automotor que se recuse à realização dos testes, exames clínicos ou perícias voltados a aferir a influência de álcool ou outra substância psicoativa
Não viola a Constituição a previsão legal de imposição das sanções administrativas ao condutor de veículo automotor que se recuse à realização dos testes, exames clínicos ou perícias voltados a aferir a influência de álcool ou outra substância psicoativa (art. 165-A e art. 277, §§ 2º e 3º, todos do Código de Trânsito Brasileiro, na redação dada pela Lei 13.281/2016).
É inadmissível qualquer nível de alcoolemia por condutores de veículos automotivos.
A eventual recusa de motoristas na realização de “teste do bafômetro”, ou dos demais procedimentos previstos no CTB para aferição da influência de álcool ou outras drogas, por não encontrar abrigo no princípio da não autoincriminação, permite a aplicação de multa e a retenção/apreensão da CNH validamente.
São constitucionais as normas que estabelecem a proibição da venda de bebidas alcóolicas em rodovias federais (Lei 11.705/2008, art. 2º).
RE 1224374/RS (Tema 1079 RG), ADI 4017/DF e ADI 4103/DF. Relator Min. Luiz Fux. Julgamento em 18 e 19.5.2022. Informativo nº 1.055 do STF.
Pendente a edição da lei complementar federal, os estados estão impedidos de editar normas que permitam o surgimento de novos entes locais, ressalvada a hipótese de convalidação do art. 96 do ADCT
Pendente a edição da lei complementar federal que assinale o prazo permitido para a criação e alteração de municípios (CF/1988, art. 18, § 4º, na redação dada pela EC 15/1996), os estados estão impedidos de editar normas que disciplinem a matéria e permitam surgimento de novos entes locais, ressalvada a hipótese de convalidação do art. 96 do ADCT.
ADPF 819/MT. Relator Ministro Luís Roberto Barroso, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes. Julgamento virtual finalizado em 6.10.2023. Informativo nº 1.111 do STF.
A iniciativa popular de emenda à Constituição do estado é compatível com a Constituição da República
A iniciativa popular de emenda à Constituição do estado (arts. 103, IV, e 110) é compatível com a Constituição da República, nomeadamente o parágrafo único do art. 1º, os incisos II e III do art. 14 e o inciso XV do art. 49. Na democracia, além dos mecanismos tradicionais por meio dos representantes eleitos, há os de participação direta com projeto de iniciativa popular.
Tal entendimento densifica a ampliação daquilo que a CF não prevê expressamente. Trata-se de certa democratização no processo de reforma das regras constitucionais estaduais. No tocante à simetria, revelou não ser obstativa ante a ausência de regra clara que afaste a faculdade de o estado aumentar os mecanismos de participação direta.
ADI 825/AP, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 25.10.2018.
O STF deve encaminhar à Casa respectiva, para os fins a que se refere art. 53, §2º, da Constituição Federal (CF), a decisão que houver aplicado medida cautelar sempre que a execução desta impossibilitar direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo
O Poder Judiciário dispõe de competência para impor, por autoridade própria, as medidas cautelares a que se refere o artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).
Contudo, o STF deve encaminhar à Casa respectiva, para os fins a que se refere art. 53, §2º, da Constituição Federal (CF), a decisão que houver aplicado medida cautelar sempre que a execução desta impossibilitar direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo.
5526/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 11.10.2017.
DIREITO ADMINISTRATIVO
A vedação ao reexame necessário da sentença de improcedência ou de extinção do processo sem resolução do mérito, prevista pelos art. 17, § 19, IV, c/c o art. 17-C, § 3º, da Lei de Improbidade Administrativa, com redação dada pela Lei n. 14.230/2021, não se aplica aos processos em curso, quando a sentença for anterior à vigência da Lei n. 14.230/2021.
A vedação ao reexame necessário introduzida pela Lei n. 14.230/2021 é aplicável aos processos em curso, desde que o ato processual de remessa (reexame) ainda não tenha sido realizado até a data de vigência da nova lei (26/10/2021). Sob o mesmo prisma não é possível a aplicação retroativa da lei nova para regulamentar atos processuais prévios à data de sua entrada em vigor.
Desse modo, no que tange à remessa oficial, a regra geral é de que sua regência se afere pela lei vigente à época da decisão recorrida, no caso a sentença.
REsp 2.117.355-MG, REsp 2.118.137-MG, REsp 2.120.300-MG, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 11/6/2025. Tema 1284. Informativo nº 854 do STJ.
1. Prefeitos que ordenam despesas têm o dever de prestar contas, seja por atuarem como responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração, seja na eventualidade de darem causa a perda, extravio ou outra irregularidade que resulte em prejuízo ao erário.
2. Compete aos Tribunais de Contas, nos termos do art. 71, II, da Constituição Federal de 1988, o julgamento das contas de Prefeitos que atuem na qualidade de ordenadores de despesas;
3. A competência dos Tribunais de Contas, quando atestada a irregularidade de contas de gestão prestadas por Prefeitos ordenadores de despesa, se restringe à imputação de débito e à aplicação de sanções fora da esfera eleitoral, independentemente de ratificação pelas Câmaras Municipais, preservada a competência exclusiva destas para os fins do art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/1990.
(ADPF 982, Relator(a): FLÁVIO DINO, Tribunal Pleno, julgado em 24-02-2025, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 14-03-2025 PUBLIC 17-03-2025) Grifo nosso.
A utilização conjunta das Leis n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) e n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) para fundamentar uma mesma ação civil não configura, por si só, violação ao princípio do non bis in idem.
É perfeitamente admissível que a mesma conduta seja analisada sob a ótica da improbidade administrativa e da responsabilidade da pessoa jurídica por atos lesivos à administração pública, previstas nas Leis n. 8.429/1992 e n. 12.846/2013, respectivamente, desde que, ao final, as duas leis não sejam empregadas para empregar punições de mesma natureza e pelos mesmos fatos.
A própria redação do art. 3º, § 2º, da Lei n. 8.429/1992, alterada recentemente, esclarece que as sanções previstas nessa lei não se aplicarão à pessoa jurídica caso o ato de improbidade seja também sancionado como ato lesivo, nos termos da Lei n. 12.846/2013.
Essa previsão tem como objetivo evitar a aplicação cumulativa ou sucessiva de sanções idênticas, mas não inviabiliza a tramitação de ações que se fundamentem simultaneamente nas duas leis. Dessa forma, a compatibilidade entre as legislações está garantida desde que, ao final do processo, sejam observados os limites impostos pela legislação para evitar que a mesma parte amargue sanções de mesma natureza pelo mesmo ato ilícito.
Nesse sentido, caso ao final da demanda sejam aplicadas as penalidades previstas na Lei Anticorrupção, ficará prejudicada a imposição das sanções estabelecidas na Lei de Improbidade em relação ao mesmo ilícito.
A propósito, o art. 30, inciso I, da Lei n. 12.846/2013 contém comando normativo no sentido de que os mecanismos previstos na Lei Anticorrupção são complementares e não substituem aqueles estabelecidos em outras legislações, como a Lei de Improbidade Administrativa.
REsp 2.107.398-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 18/2/2025, DJEN 24/2/2025.
As disposições da Lei n. 14.230/2021 são aplicáveis aos processos em curso para regular o procedimento da tutela provisória de indisponibilidade de bens, de modo que as medidas já deferidas poderão ser reapreciadas para fins de adequação à atual redação dada à Lei n. 8.429/1992 (lei de improbidade administrativa)
Com base na redação original da Lei n. 8.429/1992, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que era desnecessária a demonstração de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo para o deferimento do pedido de indisponibilidade de bens e que a medida poderia abranger o valor de eventual multa civil (Temas 701 e 1.055).
Porém, sobreveio a Lei n. 14.230/2021 que promoveu profundas alterações na Lei n. 8.429/1992. Parte dessas alterações foi direcionada à medida de indisponibilidade de bens que passou a exigir para o seu deferimento "a demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo" (art. 16, § 3º), estabelecendo que não incidirá "sobre os valores a serem eventualmente aplicados a título de multa civil ou sobre acréscimo patrimonial decorrente de atividade lícita" (art. 16, § 10).
Nessa toada, por ser a tutela provisória de indisponibilidade de bens medida que pode ser, a qualquer tempo, revogada ou modificada, a Lei n. 14.230/2021 é aplicável aos processos em curso, tanto em pedidos de revisão de medidas já deferidas como nos recursos ainda pendentes de julgamento.
Dessa forma, as disposições da Lei n. 14.230/2021 são aplicáveis aos processos em curso, para regular o procedimento da tutela provisória de indisponibilidade de bens, de modo que as medidas já deferidas poderão ser reapreciadas para fins de adequação à atual redação dada à Lei n. 8.429/1992, notadamente no que se refere à necessidade de demonstração de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo e à impossibilidade de a constrição abranger o valor da multa civil (art. 16, §§ 3º e 10).
REsp 2.074.601-MG, REsp 2.089.767-MG, REsp 2.076.137-MG, REsp 2.076.911-SP, REsp 2.078.360-MG, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 6/2/2025, DJEN 13/2/2025 (Tema 1257). Informativo nº 840 do STJ.
Quando o juízo criminal reconhece a inimputabilidade do agente fundada no art. 26 do Código Penal e profere sentença absolutória imprópria, com imposição de medida de segurança, descabe a fixação de sanção administrativa, impondo-se à Administração Pública, ao revés, o dever de avaliar a eventual concessão de licença para tratamento de saúde ou de aposentadoria por invalidez.
A certificação da inimputabilidade exige acentuada incursão fática, prévia instauração de incidente de insanidade mental (art. 149 do CPP) e detida análise de laudos médicos para avaliar a higidez psíquica do acusado, de modo que a conclusão positiva acerca da carência de discernimento cognitivo encerra juízo de certeza impassível de ulterior revisão ou desconsideração na via administrativa. Nessas circunstâncias, a despeito da ausência de disposição legal expressa determinando a repercussão da sentença penal absolutória imprópria sobre a decisão administrativa, admitir a subsistência da responsabilidade disciplinar quando rechaçada a punição criminal em razão de causa biopsicológica excludente de culpabilidade traduziria evidente incoerência.
Constatada a prática de falta disciplinar quando o agente estava em surto psicótico e absolutamente incapaz de entender o caráter ilícito do fato cometido, descabe a fixação de sanção administrativa, impondo-se à Administração Pública, ao revés, o dever de avaliar a eventual concessão de licença para tratamento de saúde ou de aposentadoria por invalidez, sendo inviável o apenamento de pessoa mentalmente enferma à época da conduta imputada.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 1/10/2024, DJe 4/10/2024.
As concessionárias de rodovias respondem, independentemente da existência de culpa, pelos danos oriundos de acidentes causados pela presença de animais domésticos nas pistas de rolamento, aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor e da Lei das Concessões
A responsabilidade objetiva das concessionárias de serviço público pelos acidentes causados pelo ingresso de animais domésticos nas pistas de rolamento vem sendo reconhecida por ambas as Turmas de Direito Privado desta Corte de Justiça, aplicando-se a teoria do risco administrativo.
O mesmo vem ocorrendo em relação à incidência do Código de Defesa do Consumidor, especialmente porque há previsão legal expressa de sua aplicação aos casos que envolvem concessionárias de serviços públicos (art. 22, caput e parágrafo único do CDC), o que é reforçado pela previsão do art. 7° da Lei n. 8.987/1995.
No julgamento do RE 608.880, foi reafirmada a tese de que a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público baseia-se na teoria do risco administrativo, inclusive nos casos de omissão.
Nos casos de acidentes provocados pelo ingresso de animais nas rodovias, os fatores determinantes para a quebra do nexo de causalidade e, consequentemente, para a exclusão da responsabilidade civil verificados no julgamento do RE 608.880 - i) intervalo entre o fato administrativo e o evento danoso e ii) superveniência de causas que contribuíram para a ocorrência do evento - não se fazem presentes.
Se os animais ingressaram na pista pouco tempo antes do acidente, não se verifica tal intervalo. Por outro lado, nos casos em que o acidente ocorre depois de um considerável intervalo de tempo, resta bem caracterizada a omissão das Concessionárias no tocante aos deveres de manejo e retirada. Além disso, não se cogita, em tese, a superveniência de fatos que contribuam para a ocorrência do evento danoso.
Além disso, o princípio da primazia do interesse da vítima, decorrente do princípio da solidariedade, impõe a reparação dos danos independentemente da identificação do proprietário do animal cujo ingresso na rodovia causou o acidente. Assim, cabe à concessionária indenizar o usuário pelos danos sofridos e, se lhe aprouver, exercer eventual direito de regresso, oportunamente, contra o dono do animal envolvido no acidente.
REsp 1.908.738-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/8/2024, DJe 26/8/2024. (Tema 1122). Informativo nº 822 do STJ.
Legitimidade para execução de multas impostas pelos Tribunais de Contas Estaduais
Inicialmente, deve-se diferenciar entre duas modalidades de responsabilidade financeira: a reintegratória e a sancionatória.
A primeira está relacionada à reposição de recursos públicos, objeto de desvio, pagamento indevido ou falta de cobrança ou liquidação nos termos da lei. A sancionatória consiste na aplicação de sanção pecuniária aos responsáveis em razão de determinadas condutas previstas em lei.
Nesse contexto, é possível o agrupamento das sanções patrimoniais de acordo com as seguintes modalidades de responsabilidade financeira:
(a) imposição do dever de recomposição do erário (imputação de débito);
(b) multa proporcional ao dano causado ao erário, que decorre diretamente e em razão do prejuízo infligido ao patrimônio público; e
(c) multa simples, aplicada em razão da inobservância de normas financeiras, contábeis e orçamentárias, ou como consequência direta da violação de deveres de colaboração (obrigações acessórias) que os agentes fiscalizados devem guardar em relação ao órgão de controle.
O Município prejudicado tem legitimidade para execução do acórdão do Tribunal de Contas estadual que, identificando prejuízo aos cofres públicos municipais, condena o gestor público a recompor o dano suportado pelo erário, bem como em relação à decisão que, no mesmo contexto e em decorrência do prejuízo causado ao erário, aplica multa proporcional ao servidor público municipal.
Já o Estado tem legitimidade para executar crédito decorrente de multas simples aplicadas a gestores municipais, por Tribunais de Contas estadual, sobretudo quando o fundamento da punição residir na inobservância das normas de Direito Financeiro ou, ainda, no descumprimento dos deveres de colaboração impostos pela legislação aos agentes públicos fiscalizados.
(ADPF 1011, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 01-07-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 04-07-2024 PUBLIC 05-07-2024)
Para fins de indisponibilidade de bens, há solidariedade entre os corréus da Ação de Improbidade Administrativa, de modo que a constrição deve recair sobre os bens de todos eles, sem divisão em quota-parte, limitando-se o somatório da medida ao quantum determinado pelo juiz, sendo defeso que o bloqueio corresponda ao débito total em relação a cada um.
REsp 1955440/DF, REsp 1955300/DF, REsp 1955957/MG, REsp 1955116/AM, Relator HERMAN BENJAMIN, Julgado em 22/05/2024. Acórdão publicado em 01/07/2024. Tema repetitivo 1213.
A negativa de banca examinadora de concurso público em atribuir pontuação à resposta formulada de acordo com precedente obrigatório do STJ constitui flagrante ilegalidade
Compete à Administração Pública a escolha dos métodos e dos critérios para aferir a aptidão e o mérito dos candidatos nos concursos públicos destinados ao provimento de cargos públicos efetivos.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 632.853/CE (Tema n. 485), sob o regime da repercussão geral, firmou a compreensão de que "não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade e inconstitucionalidade." (RE n. 632.853/CE, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/4/2015, DJe 29/6/2015).
No caso analisado, quanto à avaliação do item relativo à fixação dos ônus da sucumbência, verifica-se que a conduta da banca examinadora, ao negar pontuação à resposta formulada em estrita observância à precedente obrigatório do Superior Tribunal de Justiça, constituiu ato ilegal e contrária ao edital do certame.
A inobservância de precedente obrigatório do STJ nos certames destinados ao provimento de cargos públicos igualmente contraria à segurança jurídica e à boa-fé administrativa, além do art. 30 Decreto-Lei n. 4.657/42 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro), o qual determina que as autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas.
RMS 73.285-RS, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. Informativo nº 816 do STJ.
A penalidade administrativa deve se basear pelo princípio do tempus regit actum, salvo se houver previsão expressa de retroatividade da lei mais benéfica.
No julgamento do Tema n. 1199, o Supremo Tribunal Federal - STF apontou a necessidade de interpretação conjunta dos incisos XL e XXXVI, do art. 5º da Constituição Federal, devendo existir disposição expressa na legislação para se afastar o princípio do tempus regit actum, porque a norma constitucional que estabelece a retroatividade da lei penal mais benéfica está diretamente vinculada ao princípio do favor libertatis, peculiaridade inexistente no Direito Administrativo Sancionador.
Tal entendimento vem sendo aplicado quanto aos processos envolvendo as demandas relacionadas a improbidade administrativa, aliás, com interpretação restritiva quanto à aplicação retroativa da Lei n. 14.230/2021.
Nesse contexto, não se mostra coerente (com o entendimento do STF) que se aplique o postulado da retroatividade de lei mais benéfica aos casos em que se discute a mera redução do valor de multa administrativa.
REsp 2.103.140-ES, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 4/6/2024, DJe 18/6/2024.
A demonstração do requisito da urgência para a indisponibilidade de bens, prevista no art. 16 da Lei de Improbidade Administrativa (com a redação dada pela Lei n. 14.230/2021), tem aplicação imediata ao processo em curso dado o caráter processual da medida.
Por possuir natureza de tutela provisória de urgência cautelar, podendo ser revogada ou modificada a qualquer tempo, a decisão de indisponibilidade de bens reveste-se de caráter processual, de modo que, por força do art. 14 do CPC/2015, a norma mencionada deve ter aplicação imediata ao processo em curso.
AREsp 2.272.508-RN, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por maioria, julgado em 6/2/2024. Informativo nº 800 do STJ.
A reserva legal de percentual de vagas a ser preenchido, exclusivamente, por mulheres, em concursos públicos da área de segurança pública estadual, não pode ser interpretada como autorização para impedir que elas possam concorrer à totalidade das vagas oferecidas
É vedada a interpretação que legitime a imposição de qualquer limitação à participação de candidatas do sexo feminino nos referidos certames, visto que é inadmissível dar espaço a discriminações arbitrárias, notadamente quando inexiste, na respectiva norma, qualquer justificativa objetiva e razoável tecnicamente demonstrada para essa restrição.
A solução da controvérsia considerou, principalmente:
(i) o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil de promover o bem de todos, sem preconceitos de sexo (CF/1988, art. 3º, IV);
(ii) o direito de amplo acesso a cargos públicos, empregos e funções públicas;
(iii) a clara preocupação da Constituição Federal em garantir a igualdade entre os gêneros (art. 5º, caput e I);
(iv) a ausência de especificidade no texto constitucional relativa à participação de mulheres nos certames de ingresso aos cargos;
(v) a necessidade de incentivo, via ações afirmativas, à participação feminina na formação do efetivo das áreas de segurança pública, com a finalidade de resguardar a igualdade material; e
(vi) a inexistência de previsão legal devidamente justificada que possa validar a restrição, total ou parcial, do acesso às vagas.
ADI 7.480/SE, ADI 7.482/RR, ADI 7.491/CE, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 10.05.2024. Informativo nº 1.136 do STF.
A demissão de empregados públicos das empresas estatais, admitidos após prévia aprovação em concurso público, independe de processo administrativo, mas deve ser feita mediante ato formal que contenha a indicação das razões que o motivaram
As empresas públicas e as sociedades de economia mista, sejam elas prestadoras de serviço público ou exploradoras de atividade econômica, ainda que em regime concorrencial, têm o dever jurídico de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados concursados, não se exigindo processo administrativo. Tal motivação deve consistir em fundamento razoável, não se exigindo, porém, que se enquadre nas hipóteses de justa causa da legislação trabalhista.
Assim como ocorre na admissão, a dispensa de empregados públicos deve obediência ao princípio da impessoalidade (CF/1988, art. 37, caput), de modo que se exige a exposição de suas razões. Nesse contexto, o empregado admitido por concurso e demitido sem justa causa tem o direito de saber, seja qual for o motivo, as razões de seu desligamento.
O que se demanda é apenas a indicação por escrito dos motivos da dispensa, isto é, não há necessidade de prévio processo administrativo ou contraditório.
RE 688.267/CE, relator Ministro Alexandre de Moraes, redator do acórdão Ministro Luís Roberto Barroso, julgamento finalizado em 28.02.2024. Tema 1.022 RG. Informativo nº 1.126 do STF.
Aplica-se o regime normativo prescricional das pessoas jurídicas de direito público, previsto no Decreto n. 20.910/1932 e no Decreto-Lei n. 4.597/1942, às entidades da Administração Indireta com personalidade de direito privado que atuem na prestação de serviços públicos essenciais sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial
Isso, porque, conquanto dotadas de personalidade jurídica de direito privado, as empresas estatais fazem as vezes de ente autárquico, estreitamente ligados ao ente político ao qual se vinculam e, por conseguinte, devem, em certa medida, receber tratamento assemelhado ao da Fazenda Pública, inclusive relativamente a prazos prescricionais.
EREsp 1.725.030-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 14/12/2023, DJe 20/12/2023. Informativo do STJ - edição extraordinária nº 14.
No caso de necessidade de complementação da indenização, ao final do processo expropriatório, deverá o pagamento ser feito mediante depósito judicial direto se o Poder Público não estiver em dia com os precatórios.
Na hipótese em que o ente federativo expropriante estiver em mora com a quitação de seus precatórios (CF/1988, art. 100), o pagamento da diferença entre o valor das avaliações final e inicial do imóvel desapropriado pelo Poder Público deve ser feito por meio de depósito judicial direto ao então proprietário, em respeito à natureza prévia da indenização (CF/1988, art. 5º, XXIV).
RE 922.144/MG, relator Ministro Luís Roberto Barroso, julgamento finalizado em 19.10.2023. Informativo nº 1.113 do STF.
A impossibilidade de obtenção dos registros acerca dos dias não trabalhados ou das horas compensadas não pode se tornar um óbice para descontar os dias não trabalhados pelos servidores públicos em decorrência de greve
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 693.456/RJ, sob o regime da repercussão geral, firmou a tese de que "a administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público".
Vale ressaltar que a impossibilidade de obtenção dos registros acerca dos dias não trabalhados ou das horas compensadas não pode tornar-se um óbice para reconhecer o direito da parte autora em descontar os dias não trabalhados pelos servidores públicos, em decorrência da suspensão temporária do contrato de trabalho. Até porque o referido desconto somente será implantado após prévio procedimento administrativo em que será assegurado ao servidor o exercício do contraditório e da ampla defesa.
Pet 12.329-DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 27/9/2023, publicado em 2/10/2023.
O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não se sujeita à prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União (TCU) e a ausência dessa obrigatoriedade não representa ofensa ao art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988 (1), já que inexiste previsão expressa em sentido diverso.
Esta Corte já afastou a sujeição da OAB aos ditames impostos à Administração Pública direta e indireta, dada a sua categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas, na medida em que é uma instituição com natureza jurídica própria e dotada de autonomia e independência.
É necessário conferir o mais alto grau de liberdade para que a OAB tenha condições de cumprir suas funções constitucionalmente privilegiadas, tendo em vista que os advogados são indispensáveis à administração da Justiça (CF/1988, art. 133).
Ademais, a Ordem gere recursos privados arrecadados de seus associados, distinguindo-se dos demais conselhos de fiscalização profissional, os quais recolhem contribuição de natureza tributária, que advém da movimentação financeira do Estado
RE 1.182.189/BA, relator Ministro Marco Aurélio, redator do acórdão Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 24.4.2023. Informativo nº 1.091 do STF.
É possível a nomeação e a posse de condenado criminalmente, de forma definitiva, devidamente aprovado em concurso público, desde que haja compatibilidade entre o cargo a ser exercido e a infração penal cometida, sendo que o efetivo exercício dependerá do regime de cumprimento da pena e da inexistência de conflito de horários com a jornada de trabalho
Não se pode interpretar a norma constitucional (CF/1988, art. 15, III) como restritiva de outros direitos senão daqueles em relação aos quais se cumpre a finalidade da suspensão dos direitos políticos.
Essa suspensão funciona como efeito automático da condenação criminal definitiva e visa a impedir que o condenado participe da vida política do Estado, com a consequente restrição da capacidade eleitoral ativa e passiva.
Contudo, ainda que o pleno gozo dos direitos políticos também seja um requisito legal para a investidura em cargo público (Lei 8.112/1990, art. 5º, II), a condenação criminal transitada em julgado não impede, por si só, a nomeação e posse do condenado regularmente aprovado em concurso, visto que os seus direitos civis e sociais permanecem devidamente assegurados e, portanto, o direito de trabalhar e de ter acesso aos cargos públicos. No mesmo sentido apontam a necessidade de ressocialização dos presos e o princípio da dignidade da pessoa humana.
RE 1.282.553/RR, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento finalizado em 4.10.2023. Tema 1.190 RG. Informativo nº 1.111 do STF.
Em mandado de segurança, é vedada a oportunização ao impetrante de emenda à inicial para a indicação da correta autoridade coatora, quando a referida modificação implique na alteração da competência jurisdicional
REsp 1.954.451-RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023.
O servidor público que seja pai solo – de família em que não há a presença materna – faz jus à licença maternidade e ao salário maternidade pelo prazo de 180 dias, da mesma forma em que garantidos à mulher pela legislação de regência
À luz do art. 227 da Constituição Federal, que confere proteção integral da criança com absoluta prioridade e do princípio da paternidade responsável, a licença maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88 e regulamentada pelo art. 207 da Lei 8.112/1990, estende-se ao pai genitor monoparental.
RE 1348854/DF, relator Min. Alexandre de Moraes, julgamento finalizado em 12.5.2022. Tema 1182 RG. Informativo nº 1.054 do STF.
São inconstitucionais atos de constrição, por decisão judicial, do patrimônio de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, para fins de quitação de suas dívidas.
Tese fixada:
“Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para pagamento de suas dívidas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/1988, e dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF/1988), da separação dos poderes (arts. 2º, 60, § 4º, III, da CF/1988) e da eficiência da administração pública (art. 37, caput, da CF/1988).”
ADPF 789/MA, relator Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 20.8.2021 (sexta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.026 do STF.
A concessão de aposentadoria, com utilização do tempo de contribuição, leva ao rompimento do vínculo trabalhista nos termos do art. 37, § 14 da CF. Entretanto, é possível a manutenção do vínculo trabalhista, com a acumulação dos proventos com o salário, se a aposentadoria se deu pelo RGPS antes da promulgação da EC 103/2019
A natureza do ato de demissão de empregado público é constitucional-administrativa e não trabalhista, o que atrai a competência da Justiça comum para julgar a questão.
A concessão de aposentadoria aos empregados públicos inviabiliza a permanência no emprego, nos termos do art. 37, § 14, da Constituição Federal (CF), salvo para as aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional (EC) 103/09, nos termos do que dispõe seu art. 6º
RE 655283/DF, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgamento em 16.6.2021. Tema 606 RG. Informativo nº 1.022 do STF.
É objetiva a Responsabilidade Civil do Estado em relação a profissional da imprensa ferido por agentes policiais durante cobertura jornalística, em manifestações em que haja tumulto ou conflitos entre policiais e manifestantes. Cabe a excludente da responsabilidade da culpa exclusiva da vítima, nas hipóteses em que o profissional de imprensa descumprir ostensiva e clara advertência sobre acesso a áreas delimitadas, em que haja grave risco à sua integridade física
RE 1209429/SP, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 10.6.2021. Tema 1.055 RG. Informativo nº 1.021 do STF.
É possível a fixação de obrigações alternativas a candidatos em concursos públicos e a servidores em estágio probatório, que se escusem de cumprir as obrigações legais originalmente fixadas por motivos de crença religiosa, desde que presentes a razoabilidade da alteração, a preservação da igualdade entre todos os candidatos e que não acarrete ônus desproporcional à Administração Pública, que deverá decidir de maneira fundamentada
O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa.
RE 842846/RJ, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 27.2.2019. Informativo nº 932 do STF.
Os servidores ocupantes de cargo exclusivamente em comissão não se submetem à regra da aposentadoria compulsória prevista no art. 40, § 1º, II, da CF, a qual atinge apenas os ocupantes de cargo de provimento efetivo, inexistindo, também, qualquer idade limite para fins de nomeação a cargo em comissão. Ressalvados impedimentos de ordem infraconstitucional, não há óbice constitucional a que o servidor efetivo aposentado compulsoriamente permaneça no cargo comissionado que já desempenhava ou a que seja nomeado para cargo de livre nomeação e exoneração, uma vez que não se trata de continuidade ou criação de vínculo efetivo com a Administração.
RE 786540/DF, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 15.12.2016. Informativo 851 do STF.
Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no art. 5º, XLIX, da CF, o Estado é responsável pela morte de detento
O Colegiado asseverou que a responsabilidade civil estatal, segundo a CF/1988, em seu art. 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, uma vez rejeitada a teoria do risco integral. Assim, a omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nas hipóteses em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso.
Além disso, é dever do Estado e direito subjetivo do preso a execução da pena de forma humanizada, garantindo-se-lhe os direitos fundamentais, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral. Esse dever constitucional de proteção ao detento somente se considera violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil objetiva estatal.
Por essa razão, nas situações em que não seja possível ao Estado agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causalidade. Afasta-se, assim, a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional.
A morte do detento pode ocorrer por várias causas, como homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, não sendo sempre possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções exigíveis.
Portanto, a responsabilidade civil estatal fica excluída nas hipóteses em que o Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento, rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso.
RE 841526/RS, rel. Min. Luiz Fux, 30.3.2016. Informativo nº 819 do STF.
DIREITO CIVIL
A pretensão indenizatória por danos materiais em transporte aéreo internacional de carga e mercadoria está sujeita aos limites previstos em normas e tratados internacionais firmados pelo Brasil, em especial as Convenções de Varsóvia e de Montreal
É infraconstitucional e fática a controvérsia sobre o afastamento da limitação à pretensão indenizatória quando a transportadora tem conhecimento do valor da carga ou age com dolo ou culpa grave.
A decisão ampliou para o transporte de cargas o entendimento que o STF já tinha sobre o transporte de passageiros e extravios de bagagens, conforme assentado no Tema nº 210 da Repercussão Geral:
"Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor."
(RE 1520841 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 03-02-2025, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-038 DIVULG 11-02-2025 PUBLIC 12-02-2025) Repercussão geral - Tema nº 1366. Informativo nº 1.164 do STF.
(RE 636331, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25-05-2017, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-257 DIVULG 10-11-2017 PUBLIC 13-11-2017)
Nas hipóteses de danos morais decorrentes de contrato de transporte aéreo internacional de passageiros, o Código de Defesa do Consumidor prevalece sobre as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas (Convenções de Varsóvia e Montreal)
Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. O presente entendimento não se aplica às hipóteses de danos extrapatrimoniais.
ARE 766.618 ED/SP, relator Ministro Luís Roberto Barroso, julgamento finalizado em 30.11.2023. Tema 210 RG. Informativo nº 1.119 do STF.
Em suma, a pretensão indenizatória quanto ao transporte aéreo internacional de passageiros, cargas e mercadorias está sujeita aos limites previstos em normas e tratados internacionais firmados pelo Brasil, em especial as Convenções de Varsóvia e de Montreal?
Quanto aos danos morais - não. Aplica-se a reparação integral do dano prevista no CDC.
Danos materiais - sim. As normas e tratados internacionais limitadores da responsabilidade, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, prevalecem sobre o CDC.
O prazo prescricional para propor ação de petição de herança conta-se da abertura da sucessão, cuja fluência não é impedida, suspensa ou interrompida pelo ajuizamento de ação de reconhecimento de filiação, independentemente do seu trânsito em julgado
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos EAREsp n. 1.260.418/MG (Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira, julgado em 26/10/2022, DJe 24/11/2022), dissipou a intensa divergência então existente entre as suas Turmas de Direito Privado, para compreender que o prazo prescricional para propor ação de petição de herança conta-se da abertura da sucessão, aplicada a vertente objetiva do princípio da actio nata, adotada como regra no ordenamento jurídico nacional (arts. 177 do CC/1916 e 189 do CC/2002).
O pretenso herdeiro poderá, desde logo e independentemente do reconhecimento oficial desta condição (a de herdeiro), postular seus direitos hereditários, nos seguintes moldes: "i) propor ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança; ii) propor concomitantemente, mas em processos distintos, ação de investigação de paternidade e ação de petição de herança, caso em que ambas poderão tramitar simultaneamente, ou se poderá suspender a petição de herança até o julgamento da investigatória; e iii) propor ação de petição de herança, na qual deverão se discutidas, na esfera das causas de pedir, a efetiva paternidade do falecido e a violação do direito hereditário".
Reputa-se, assim, absolutamente insubsistente a alegação de que a pretensão de reivindicar os direitos sucessórios apenas surgiria a partir da decisão judicial que reconhece a qualidade de herdeiro.
REsp 2.029.809-MG, REsp 2.034.650-SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/5/2024 (Tema 1200). Informativo nº 813 do STJ.
Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros. A notificação extrajudicial por meio digital ou eletrônico é válida para comprovar a mora do devedor, desde que enviada ao endereço eletrônico indicado no contrato e comprovado seu recebimento.
O art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969 é expresso ao prever que a mora nos contratos de alienação fiduciária decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com Aviso de Recebimento.
Ademais, por interpretação analógica, a notificação por correio eletrônico, quando encaminhada ao endereço eletrônico indicado pelo próprio devedor no contrato e acompanhada de comprovação idônea de seu recebimento, atende aos requisitos essenciais da notificação extrajudicial para constituição em mora do devedor fiduciante, uma vez cumpridos os mesmos requisitos aplicáveis à carta registrada com aviso de recebimento.
REsp 1.951.662-RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, por maioria, julgado em 9/8/2023. (Tema 1132). REsp 1.951.888-RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, por maioria, julgado em 9/8/2023 (Tema 1132). Informativo nº 782 do STJ.
(REsp n. 2.183.860/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 8/5/2025, DJEN de 19/5/2025.)
O vazamento de dados pessoais não gera dano moral presumido
O art. 5º, II, da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD dispõe de forma expressa quais dados podem ser considerados sensíveis e, devido a essa condição, exigir tratamento diferenciado, previsto em artigos específicos. Os dados de natureza comum, pessoais mas não íntimos, passíveis apenas de identificação da pessoa natural não podem ser classificados como sensíveis.
Os dados objeto da lide são aqueles que se fornece em qualquer cadastro, inclusive nos sites consultados no dia a dia, não sendo, portanto, acobertados por sigilo, e o conhecimento por terceiro em nada violaria o direito de personalidade da recorrida.
O vazamento de dados pessoais, a despeito de se tratar de falha indesejável no tratamento de dados de pessoa natural por pessoa jurídica, não tem o condão, por si só, de gerar dano moral indenizável. Ou seja, o dano moral não é presumido, sendo necessário que o titular dos dados comprove eventual dano decorrente da exposição dessas informações.
Diferente seria se, de fato, estivéssemos diante de vazamento de dados sensíveis, que dizem respeito à intimidade da pessoa natural.
AREsp 2.130.619-SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 7/3/2023, DJe 10/3/2023.
É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial
A exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família contida no inciso VII do art. 3º da Lei 8.009/1990 é necessária, proporcional e razoável, mesmo na hipótese de locação comercial.
É necessária e proporcional, pois os outros meios legalmente aceitos para garantir o contrato de locação comercial, tais como caução e seguro-fiança, são mais custosos para grande parte dos empreendedores. Dessa forma, a fiança afigura-se a garantia que melhor propicia ganhos em termos da promoção da livre iniciativa, da valorização do trabalho e da defesa do consumidor.
Já a razoabilidade se assenta no fato de que o fiador tem livre disposição dos seus bens, o que deixa patente que a restrição ao seu direito de moradia encontra guarida no princípio da autonomia privada e da autodeterminação das pessoas, que é um princípio que integra a própria ideia ou direito de personalidade.
RE 1307334/SP, relator Min. Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 8.3.2022. Informativo nº 1.046 do STF.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Na hipótese de execução de dívida de natureza não alimentar, é possível a penhora de salário, ainda que este não exceda 50 salários mínimos, quando garantido o mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família
Esse juízo de ponderação entre os princípios simultaneamente incidentes na espécie há de ser solucionado à luz da dignidade da pessoa humana, que resguarda tanto o devedor quanto o credor, e mediante o emprego dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
A fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família.
Importante salientar, porém, que essa relativização reveste-se de caráter excepcional e dela somente se deve lançar mão quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução e, repita-se, desde que avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado.
EREsp 1.874.222-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/4/2023.
É devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra
É devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra;
O valor recebido a título de honorários sucumbenciais deve ser destinado, exclusivamente, ao aparelhamento das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição.
RE 1.140.005/RJ, relator Ministro Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 23.6.2023. Tema 1.002 RG. Informativo nº 1.100 do STF.
Na cobrança de obrigação alimentar, é cabível a cumulação das medidas executivas de coerção pessoal e de expropriação no âmbito do mesmo procedimento executivo, desde que não haja prejuízo ao devedor nem ocorra qualquer tumulto processual
Em regra, é cabível a cumulação das medidas executivas da coerção pessoal e da expropriação no âmbito do mesmo procedimento executivo, desde que não haja prejuízo ao devedor (a ser devidamente comprovado por ele) nem ocorra qualquer tumulto processual, ambos a serem avaliados pelo magistrado no caso concreto.
Por outro lado, é recomendável que credor especifique, em tópico próprio, a sua pretensão ritual em relação a eles, assim como o mandado de citação/intimação deverá prever as diferentes consequências de acordo com as diferentes prestações. A defesa do requerido, por sua vez, poderá se dar em tópicos ou, separadamente, com a justificação em relação as prestações atuais e impugnação ou embargos para se opor às prestações pretéritas.
Apenas se houver demonstração de algum prejuízo pelo devedor ou se o magistrado vislumbrar a ocorrência de tumulto processual em detrimento da prestação jurisdicional é que se determinará a cisão do feito, como o apensamento em apartado de um dos requerimentos.
Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 09/08/2022. Informativo nº 744 do STJ.
No mesmo sentido: (REsp n. 2.192.314/PR, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 16/6/2025, DJEN de 24/6/2025.)
As decisões definitivas de Juizados Especiais podem ser invalidadas quando se fundamentarem em norma, aplicação ou interpretação jurídicas declaradas inconstitucionais pelo Plenário do STF — em controle difuso ou concentrado de constitucionalidade — antes ou depois do trânsito em julgado.
Teses fixadas pelo STF:
“1) É possível aplicar o artigo 741, parágrafo único, do CPC/1973, atual art. 535, § 5º, do CPC/2015, aos feitos submetidos ao procedimento sumaríssimo, desde que o trânsito em julgado da fase de conhecimento seja posterior a 27.8.2001;
2) É admissível a invocação como fundamento da inexigibilidade de ser o título judicial fundado em ‘aplicação ou interpretação tida como incompatível com a Constituição’ quando houver pronunciamento jurisdicional, contrário ao decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, seja no controle difuso, seja no controle concentrado de constitucionalidade;
3) O art. 59 da Lei 9.099/1995 não impede a desconstituição da coisa julgada quando o título executivo judicial se amparar em contrariedade à interpretação ou sentido da norma conferida pela Suprema Corte, anterior ou posterior ao trânsito em julgado, admitindo, respectivamente, o manejo:
(i) de impugnação ao cumprimento de sentença; ou
(ii) de simples petição, a ser apresentada em prazo equivalente ao da ação rescisória.”
RE 586.068/PR, relatora Ministra Rosa Weber, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes, julgamento finalizado em 9.11.2023. Tema 100 RG. Informativo nº 1.116 do STF.
É inconstitucional — por violar os princípios do juiz natural, da razoabilidade e da proporcionalidade — o inciso VIII do art. 144 do Código de Processo Civil (CPC/2015), que estabelece que o magistrado está impedido de atuar nos processos em que a parte seja cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, ainda que essa mesma parte seja representada por advogado de escritório diverso
Nesse contexto, uma cláusula aberta e excessivamente abrangente, como a prevista no dispositivo impugnado, é irrazoável e inviabiliza, sobremaneira, a efetividade da jurisdição, pois define causa de impedimento sem dar ao juiz o poder ou os meios para pesquisar a carteira de clientes do escritório de seu familiar, limitando a sua averiguação às informações apresentadas por terceiros.
Ademais, a regra prevista pelo dispositivo impugnado gera uma presunção absoluta de impedimento, em contrariedade ao princípio do juiz natural (CF/1988, art. 5º, XXXVII e LIII).
ADI 5.953/DF, relator Ministro Edson Fachin, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 21.8.2023. Informativo nº 1.104 do STF.
Não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de "causa decidida", mas apenas naquele que aplique a tese fixada, que resolve a lide, desde que observados os demais requisitos constitucionais do art. 105, III, da Constituição Federal e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema.
REsp 1.798.374-DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 18/05/2022.
Não se aplica o art. 21 do Marco Civil da Internet para os casos de divulgação não autorizada de imagens de nudez produzidas para fins comerciais
De plano, registre-se que o art. 21 do Marco Civil da internet traz exceção à regra de reserva da jurisdição estabelecida no art. 19 do mesmo diploma legal, a fim de impor ao provedor, de imediato, a exclusão, em sua plataforma, da chamada "pornografia de vingança" - que, por definição, ostenta conteúdo produzido em caráter particular -, bem como de toda reprodução de nudez ou de ato sexual privado, divulgado sem o consentimento da pessoa reproduzida.
Há, dado o caráter absolutamente privado em que este material foi confeccionado (independentemente do conhecimento ou do consentimento da pessoa ali reproduzida quando de sua produção), uma exposição profundamente invasiva e lesiva, de modo indelével, à intimidade da pessoa retratada, o que justifica sua pronta exclusão da plataforma, a requerimento da pessoa prejudicada, independentemente de determinação judicial para tanto.
Ademais, o dispositivo legal exige, de modo expresso e objetivo, que o conteúdo íntimo, divulgado sem autorização, seja produzido em "caráter privado", ou seja, de modo absolutamente reservado, íntimo e privativo, advindo, daí sua natureza particular. É dizer, o preceito legal tem por propósito proteger/impedir a disponibilização, na rede mundial de computadores, de conteúdo íntimo produzido em caráter privado, sem autorização da pessoa reproduzida, independentemente da motivação do agente infrator.
Deste modo, as imagens de nudez, produzidas e cedidas para fins comerciais - absolutamente lícitos -, não ostentam natureza privada, objeto de resguardo do art. 21 da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet).
Registra-se que a proteção a essas imagens de nudez, cujo conteúdo íntimo não foi produzido em caráter privado, deve se dar segundo os ditames do art. 19, que estabelece a responsabilização do provedor, caso, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, nos limites técnicos do seu serviço, tornar indisponível o conteúdo apontando.
REsp 1.930.256-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por maioria, julgado em 07/12/2021.
Resumo:
Regra geral: aplica-se o artigo 19 do MCI, sendo necessária determinação judicial para a remoção do conteúdo.
Exceção: aplica-se o artigo 21 do MCI quando houver a divulgação de imagens, vídeos ou outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado, sem autorização de seus participantes, situação em que basta a notificação extrajudicial do provedor para a remoção do conteúdo (proteção da intimidade).
Observação: Aplica-se o artigo 19 do MCI, sendo necessária determinação judicial para a remoção do conteúdo, para os casos de divulgação não autorizada de imagens de nudez produzidas para fins comerciais (lesão patrimonial com a proteção apenas indireta da intimidade).
Não é possível a determinação judicial à Fazenda Pública de adoção da prática jurisprudencial da execução invertida no cumprimento de sentença em procedimento comum.
O procedimento denominado "execução invertida" consiste na modificação do rito processual estabelecido no Código de Processo Civil, ofertando à parte executada (devedor) a possibilidade de apresentação dos cálculos e valor devido à parte exequente (credor). Não há previsão legal de tal mecanismo processual, sendo ele uma construção jurisprudencial.
AREsp 2.014.491-RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/12/2023. Informativo nº 799 do STJ.
ADPF 219/DF, relator Min. Marco Aurélio, julgamento em 20.5.2021. Informativo nº 1.018 do STF.
DIREITO PENAL
A embriaguez voluntária e o ânimo exaltado do réu são insuficientes para afastar o dolo específico necessário para a configuração do crime de injúria racial.
AREsp 2.835.056-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 20/5/2025.
O delito de falsa identidade é crime formal, que se consuma quando o agente fornece, consciente e voluntariamente, dados inexatos sobre sua real identidade, e, portanto, independe da ocorrência de resultado naturalístico.
Contudo, bem alerta a doutrina sobre o tema, a obtenção da finalidade perseguida pelo agente é irrelevante para a configuração típica, em razão da natureza formal do crime.
A consumação delitiva ocorre assim que o agente inculca a si ou a outrem a falsa identidade, sendo irrelevantes a causação de prejuízo ou a obtenção de efetiva vantagem pelo agente. É indiferente, para a consumação típica, o fato de o destinatário da declaração falsa verificar, em sequência, a real identidade do indivíduo, ou mesmo ter o próprio agente se identificado corretamente em momento posterior.
Em outras palavras, a inexistência de prejuízo a terceiros ou às investigações não afasta a tipificação do crime e, dessa forma, não conduz à absolvição do acusado.
Em resumo, o crime de falsa identidade é formal, ou seja, consuma-se com a simples conduta de atribuir-se falsa identidade, apta a ocasionar o resultado jurídico do crime, sendo dispensável a ocorrência de resultado naturalístico, consistente na obtenção de vantagem para si ou para outrem ou de prejuízo a terceiros.
REsp 2.083.968-MG, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 14/5/2025. Tema 1255. Informativo nº 850 do STJ.
A prática de roubo no período noturno, por si só, não justifica a exasperação da pena-base, pois tal circunstância não é reveladora da maior gravidade do modus operandi.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 8/4/2025.
O monitoramento realizado por câmera instalada em via pública não configura ação controlada e prescinde de autorização judicial, sendo diligência legítima para angariar indícios de prática criminosa.
No caso, o monitoramento realizado deixa de violar o direito à intimidade, pois a câmera foi instalada em um poste de energia elétrica, captando imagens da via pública (espaço de acesso coletivo, e não privado), em conformidade com o princípio constitucional da segurança pública.
Em analogia, se um policial pode, em via pública, ao realizar as denominadas "campanas", observar e relatar em juízo competente a movimentação suspeita constatada, o que é aceito como prova testemunhal válida, não há motivo lógico para que se crie óbice ao uso substitutivo da tecnologia para tanto, realizando o agente policial os registros por meio de uma câmera de vigilância ou até mesmo de um telefone celular, em um local público (via pública), o que não ofende nenhuma garantia constitucional que resguarda a intimidade da pessoa investigada.
Não se trata, pois, de ação controlada, prevista no artigo 53, II, da Lei n. 11.343/2006, a exigir autorização judicial. A câmera exclusivamente registrou a movimentação do investigado em espaço público, sem invasão à privacidade protegida constitucionalmente, algo que poderia ser feito por agente policial de forma presencial, com a natural posterior admissão em juízo a título de prova testemunhal, e a captação por meio de filmagem resguarda a ampla defesa e o contraditório, na medida em que é fidedigna aos fatos.
AgRg no RHC 203.030-SC, Rel. Ministro Carlos Cini Marchionatti (Desembargador convocado do TJRS), Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 1º/4/2025, DJEN 8/4/2025.
É desnecessária perícia técnica para configurar a qualificadora referente à escalada em furto cujo iter criminis foi testemunhado pelos policiais.
Compreende-se configurada a escalada como qualificadora do furto quando constatado o emprego de qualquer meio anormal para alcançar o bem a ser subtraído. Assim, saltar um muro alto, cavar um túnel por baixo de obstáculos ou subir em uma árvore para subtrair patrimônio alheio bastam para aplicar a forma qualificada do furto.
No caso, apesar de não realizada perícia técnica, o furto de fios de eletricidade e de telefonia por meio de escalada foi comprovado pelo depoimento dos dois policiais que efetuaram a prisão em flagrante da acusada com uma mochila preenchida com res furtivae e com lâminas, enquanto o comparsa estava no alto de um poste.
Não é o caso de cogitar de investigação sobre a permanência de vestígios do crime, pois os policiais presenciaram o iter criminis e detiveram os agentes durante a subtração.
Trata-se de prova incontestável sobre a materialidade, caracterizada pelo emprego de escalada, o que dispensa a realização de perícia técnica.
AgRg no AREsp 2.703.772-DF, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 18/2/2025, DJEN de 24/2/2025.
A Lei Maria da Penha prevalece quando suas disposições conflitarem com as de estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente
1. A condição de gênero feminino é suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de violência doméstica e familiar, prevalecendo sobre a questão etária.
2. A Lei Maria da Penha prevalece quando suas disposições conflitarem com as de estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente.
REsp 2.015.598-PA, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 6/2/2025, DJEN de 13/2/2025. (Tema 1186). Informativo nº 840 do STJ.
O crime de estupro de vulnerável praticado no contexto da violência doméstica e familiar deve ser julgado:
1) Pela vara especializada em crimes contra a criança e adolescente;
2) Caso não exista vara especializada em crimes contra a criança e adolescente na Comarca, a competência é da vara especializada em violência doméstica;
3) Quando não houver vara especializada em crimes contra a criança e adolescente e vara especializada em violência doméstica, a competência é da vara criminal comum.
A injúria racial não se configura em ofensas dirigidas a pessoas brancas exclusivamente por esta condição, tendo em vista que o racismo é um fenômeno estrutural que visa proteger grupos minoritários historicamente discriminados
O racismo é um fenômeno social construído com base no contexto histórico do século XVI, notabilizando-se a partir de invasões, espoliações e dominação dos povos europeus, especialmente sobre aqueles que vivam na América, África e Ásia. Assim, a estigmatização humana não foi outra coisa senão uma forma de hierarquizar e inferiorizar todos aqueles que foram considerados inferiores pelos que se apresentaram como colonizadores.
O fato é que tal dinâmica segue estabelecida. Em outras palavras, o racismo como fenômeno estruturado, acaba por se revelar, muitas vezes, em atos e posturas silenciosas.
A injúria racial, conforme o art. 2º-A da Lei n. 7.716/1989, visa proteger grupos minoritários historicamente discriminados, não se aplicando a ofensas dirigidas a pessoas brancas por sua condição. O conceito de racismo reverso é rejeitado, pois o racismo é um fenômeno estrutural que historicamente afeta grupos minoritários, não se aplicando a grupos majoritários em posições de poder.
A expressão "grupos minoritários" induvidosamente não se refere ao contingente populacional de determinada coletividade, mas àqueles que, ainda que sejam numericamente majoritários, não estão igualmente representados nos espaços de poder, público ou privado, que são frequentemente discriminados inclusive pelo próprio Estado e que, na prática, têm menos acesso ao exercício pleno da cidadania.
Portanto, é inviável a interpretação de existência do crime de injúria racial cometido contra pessoa, cuja pele seja de cor branca, quando tal característica for o cerne da ofensa.
Vale esclarecer que a conclusão exposta não resulta na impossibilidade de uma pessoa branca ser ofendida por uma pessoa negra. A honra de todas as pessoas é protegida pela lei, inclusive pelo tipo penal da injúria simples (caput do art. 140 do Código Penal). Contudo, especificamente a injúria racial, caracterizada pelo elemento de discriminação em exame, não se configura no caso em apreço, sem prejuízo do exame de eventual ofensa à honra, desde que sob adequada tipificação.
HC 929.002-AL, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 4/2/2025.
A majorante do art. 40, inciso IV, da Lei n. 11.343/2006 aplica-se quando há nexo finalístico entre o uso da arma e o tráfico de drogas, sendo a arma usada para garantir o sucesso da atividade criminosa, hipótese em que o crime de porte ou posse ilegal de arma é absorvido pelo tráfico. Do contrário, o delito previsto no Estatuto do Desarmamento é considerado crime autônomo, em concurso material com o tráfico de drogas.
A decisão reflete uma visão pragmática sobre o uso de armas no tráfico de drogas, reconhecendo que o porte ou posse é comumente associado à proteção das atividades ilícitas, à intimidação de terceiros ou à própria execução de delitos relacionados.
REsp 1.994.424-RS, REsp 2.000.953-RS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 27/11/2024. Tema 1259. Informativo nº 835 do STJ.
A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal
Os termos "sempre agravam a pena" e "sempre atenuam a pena", constantes, respetivamente, dos artigos 61 e 65 do Código Penal, devem ser interpretados no sentido de que, diante de uma agravante ou atenuante prescrita nesses dispositivos legais, o julgador está obrigado a aplicar a circunstância, ou seja, não pode, mesmo que fundamentadamente, afastar o aumento ou a diminuição. Isso não significa, por outro lado, que seja possível a redução abaixo do mínimo ou o aumento acima do máximo. Assim, a atenuante sempre atenua, desde que respeitada a pena mínima.
A tentativa de superação da Súmula n. 231 do STJ não encontra respaldo jurídico.
REsp 1.869.764-MS, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Rel. para acórdão Ministro Messod Azulay Neto, Terceira Seção, por maioria, julgado em 14/8/2024.
É válida a aplicação retroativa do percentual de 50% (cinquenta por cento), para fins de progressão de regime, a condenado por crime hediondo, com resultado morte, que seja reincidente genérico, nos moldes da alteração legal promovida pela Lei n. 13.964/2019 no art. 112, inc. VI, alínea a, da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal), bem como a posterior concessão do livramento condicional, podendo ser formulado posteriormente com base no art. 83, inc. V, do Código Penal, o que não configura combinação de leis na aplicação retroativa de norma penal material mais benéfica.
Na linha do entendimento jurisprudencial firmado no STJ, há possibilidade de concessão do livramento condicional da pena aos condenados por crimes hediondos com resultado morte, não reincidentes ou reincidentes genéricos, pois a vedação trazida pela Lei n. 13.964/2019, que alterou a Lei n. 7.210/84, refere-se apenas ao período previsto para a progressão de regime, havendo a possibilidade de formulação de pedido do referido benefício posteriormente, após o cumprimento do percentual estabelecido, com base no art. 83, inc. V, do CP, que permanece vigente no ordenamento jurídico, não havendo que se falar em combinação de leis.
REsp 2.012.101-MG, REsp 2.012.112-MG, REsp 2.016.358-MG, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado Do TJDFT), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 22/5/2024, DJe 27/5/2024. Tema 1196. Informativo nº 813 do STJ.
O inadimplemento da pena de multa, mesmo após o cumprimento da pena de prisão ou da pena restritiva de direitos, não impede a extinção da punibilidade, desde que o condenado alegue hipossuficiência, salvo se o juiz competente, em decisão devidamente fundamentada, entenda de forma diferente, indicando especificamente a capacidade de pagamento da penalidade pecuniária.
REsp 2.090.454-SP, REsp 2.024.901-SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 28/02/2024, DJe 1/3/2024. Revisão do Tema 931. Informativo nº 803 do STJ.
A ausência de violência ou grave ameaça na conduta do réu de apalpar as partes íntimas de vítima (por dentro das roupas), com o objetivo de satisfazer sua lascívia, impõe a desclassificação do crime de estupro para o delito importunação sexual.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 6/2/2024, DJe 15/2/2024.
A restituição imediata e integral do bem furtado não constitui, por si só, motivo suficiente para a incidência do princípio da insignificância.
(REsp n. 2.062.375/AL, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 25/10/2023, DJe de 30/10/2023.) Tema Repetitivo 1205.
No crime de estupro de vulnerável, é possível a aplicação da fração máxima de majoração prevista no art. 71, caput, do Código Penal, ainda que não haja a delimitação precisa do número de atos sexuais praticados, desde que o longo período de tempo e a recorrência das condutas permita concluir que houve 7 (sete) ou mais repetições.
REsp 2.029.482-RJ, REsp 2.050.195-RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 17/10/2023. Tema 1202. Informativo nº 792 do STJ.
A reincidência pode ser admitida pelo juízo das execuções penais para análise da concessão de benefícios, ainda que não reconhecida pelo juízo que prolatou a sentença condenatória.
Ainda que não reconhecida na condenação, a reincidência deve ser observada pelo Juízo das Execuções para concessão de benefícios, sendo descabida a alegação de reformatio in pejus ou de violação da coisa julgada, pois se trata de atribuições distintas. Há, na verdade, a individualização da pena relativa à apreciação de institutos próprios da execução penal.
REsp 2.049.870-MG, REsp 2.055.920-MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por maioria, julgado em 17/10/2023, DJe 20/10/2023. Tema 1208 RG. Informativo nº 792 do STJ.
O dano moral sofrido pela vítima é inerente aos crimes praticados contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, de modo que a fixação do respectivo valor mínimo indenizatório (CPP/1941, art. 387, IV) pressupõe o respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, viabilizados pela oportunidade de manifestação do réu durante o curso da ação penal.
O crime praticado contra a mulher no âmbito doméstico e familiar resulta em dano moral in re ipsa, ou seja, independe de instrução probatória específica para a sua apuração, uma vez que a simples comprovação da prática da conduta delitiva é suficiente para demonstrá-lo, ainda que minimamente.
ARE 1.369.282 AgR/SE, relator Ministro Ricardo Lewandowski, redator do acordão Ministro Edson Fachin, julgamento finalizado em 19.9.2023. Informativo nº 1.109 do STF.
O princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão a o contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação.
REsp 1.971.993-SP, REsp 1.977.652-SP, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Rel. para acórdão Ministro Sebastião Reis Junior, Terceira Seção, por maioria, julgado em 13/9/2023, DJe 19/9/2023. Tema 1143. Informativo nº 787 do STJ.
É admitida a aplicação do princípio da insignificância ao crime de contrabando de cigarros ao reincidente, desde que a reincidência ocorra por crimes de natureza diversa ao contrabando, não se aplicando o Tema 1143/STJ.
AgRg no RHC 185.605-RS, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 24/6/2024, DJe 27/6/2024.
A vedação constante do art. 17 da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) obsta a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito secundário do tipo penal imputado.
Tal interpretação implica na compreensão de que a proibição legal também se aplica à hipótese de multa estabelecida como uma pena autônoma na parte secundária do tipo penal, como é o caso do crime de ameaça (art. 147 do Código Penal). Com efeito, a imposição desse tipo de penalidade (multa) em crimes cometidos de acordo com o artigo 5º da Lei n. 11.340/2006 só pode ocorrer de forma cumulativa, nunca de maneira isolada.
REsp 2.049.327-RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 14/6/2023. Tema 1189. Informativo nº 779 do STJ.
1. Nos termos do § 1º do art. 155 do Código Penal, se o crime de furto é praticado durante o repouso noturno, a pena será aumentada de um terço.
2. O repouso noturno compreende o período em que a população se recolhe para descansar, devendo o julgador atentar-se às características do caso concreto.
3. A situação de repouso está configurada quando presente a condição de sossego/tranquilidade do período da noite, caso em que, em razão da diminuição ou precariedade de vigilância dos bens, ou, ainda, da menor capacidade de resistência da vítima, facilita-se a concretização do crime.
4. São irrelevantes os fatos das vítimas estarem ou não dormindo no momento do crime, ou o local de sua ocorrência, em estabelecimento comercial, via pública, residência desabitada ou em veículos, bastando que o furto ocorra, obrigatoriamente, à noite e em situação de repouso.
(REsp n. 1.979.998/RS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, julgado em 22/6/2022, REPDJe de 30/06/2022, DJe de 27/6/2022.) Tema repetitivo nº 1.144 do STJ.
A causa de aumento prevista no § 1° do art. 155 do Código Penal (prática do crime de furto no período noturno) não incide no crime de furto na sua forma qualificada (§ 4°).
A disposição técnica do Código Penal assim se apresenta: refere-se o art. 155, § 1º, do CP à pena do furto simples, prevista no caput desse dispositivo. Desse modo, não se refere à cominação do furto qualificado, que se encontra três parágrafos depois. Seguindo a técnica legislativa, para que considerasse aplicável a majorante no furto qualificado, deveria o legislador colocar o § 1º após a pena atribuída, o que não ocorreu. Se a qualificação do delito é apresentada em parágrafo posterior ao que trata da majorante, é porque o legislador afastou a incidência desta em relação aos crimes qualificados previstos no § 4º do art. 155 do CP. Nesse contexto, aderindo a uma interpretação sistemática sob o viés topográfico, em que se define a extensão interpretativa de um dispositivo legal levando-se em conta sua localização no conjunto normativo, a aplicação da referida causa de aumento limitar-se-ia ao furto simples, não incidindo, pois, no furto qualificado.
A agravação da pena derivada da incidência da majorante do furto noturno nas hipóteses do furto qualificado resultaria em um desproporcional quantitativo.
Sendo o furto privilegiado (§ 2º do art. 155) uma norma não incriminadora, pode comportar extensividade quando utilizado para integração do sistema jurídico penal. Já o furto cometido durante o repouso noturno, por ser uma norma incriminadora, tem sua extensividade vedada.
REsp 1.890.981-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 25/05/2022. Tema 1087.
A progressão de regime do reincidente não específico em crime hediondo ou equiparado com resultado morte deve observar o que previsto no inciso VI, a, do artigo 112 da Lei de Execução Penal.
A leitura da atual redação do dispositivo em comento revela, porém, que a situação em exame (condenado por crime hediondo, reincidente não específico) não foi contemplada na lei. Vejamos: Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: […] V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; […] VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
Dessa forma, em relação aos apenados que foram condenados por crime hediondo mas que são reincidentes em razão da prática anterior de crimes comuns não há percentual previsto na Lei de Execuções Penais, em sua nova redação, para fins de progressão de regime, visto que os percentuais de 60% e 70% se destinam unicamente aos reincidentes específicos, não podendo a interpretação ser extensiva, vez que seria prejudicial ao apenado. Assim, por ausência de previsão legal, o julgador deve integrar a norma aplicando a analogia in bonam partem.
No caso (condenado por crime hediondo com resultado morte, reincidente não específico), diante da lacuna na lei, deve ser observado o lapso temporal relativo ao primário. Impõe-se, assim, a aplicação do contido no inciso VI, a, do referido artigo da Lei de Execução Penal, exigindo-se, portanto, o cumprimento de 50% da pena para a progressão de regime.
HC 581.315-PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 06/10/2020, DJe 19/10/2020.
A oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 972.598. RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO. Plenário, Sessão Virtual de 24.4.2020 a 30.4.2020. Informativo nº 985 do STF.
Eventuais condenações criminais do réu transitadas em julgado e não utilizadas para caracterizar a reincidência somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente
Com efeito, a doutrina, ao esmiuçar os elementos constituintes das circunstâncias judiciais constantes do art. 59 do Código Penal, enfatiza que a conduta social e a personalidade do agente não se confundem com os antecedentes criminais, porquanto gozam de contornos próprios - referem-se ao modo de ser e agir do autor do delito -, os quais não podem ser deduzidos, de forma automática, da folha de antecedentes criminais do réu.
Trata-se da atuação do réu na comunidade, no contexto familiar, no trabalho, na vizinhança (conduta social), do seu temperamento e das características do seu caráter, aos quais se agregam fatores hereditários e socioambientais, moldados pelas experiências vividas pelo agente (personalidade social).
EAREsp 1.311.636-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, Terceira Seção, por maioria, julgado em 10/04/2019, DJe 26/04/2019.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
É válida a sentença proferida de forma oral e registrada por meio audiovisual, sem a transcrição integral na ata de audiência.
REsp 2.009.368-BA, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 11/2/2025, DJEN 17/2/2025.
1. A confissão pelo investigado na fase de inquérito policial não constitui exigência do art. 28-A do Código de Processo Penal para o cabimento de Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), sendo inválida a negativa de formulação da respectiva proposta baseada em sua ausência.
2. A formalização da confissão para fins do ANPP pode se dar no momento da assinatura do acordo, perante o próprio órgão ministerial, após a ciência, avaliação e aceitação da proposta pelo beneficiado, devidamente assistido por defesa técnica, dado o caráter negocial do instituto.
Não se pode perder de vista, diante de tal questão, a garantia convencional de não ser obrigado a depor contra si mesmo ou declarar-se culpado (art. 8.2, "g", da Convenção Americana de Direitos Humanos).
Também não é cabível exigir que tal opção seja tomada "no escuro", antes mesmo de se saber se haverá ou não proposta - e consequente tratativa - da solução negociada, quais os seus termos, bem como os elementos de que dispõe a acusação para a formulação de eventual denúncia.
Portanto, não atende à garantia do art. 8.2, "g", da Convenção Americana de Direitos Humanos a exigência de confissão pelo investigado a respeito do cometimento do crime, durante a fase de inquérito policial; e não observa seu art. 29, "b", a interpretação de que o uso de tal garantia na fase de inquérito impede o acesso à negociação de eventual ANPP.
Nada impede que a confissão seja levada a efeito perante o próprio órgão ministerial, após a formulação da proposta de acordo, sua avaliação (assistida por defesa técnica), eventual negociação e aceitação dos termos do ANPP.
REsp 2.161.548-BA, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/3/2025. Tema 1303. Informativo nº 843 do STJ.
A confissão judicial, em princípio, é, obviamente, lícita. Todavia, para a condenação, apenas será considerada a confissão que encontre algum sustento nas demais provas, tudo à luz do art. 197 do CPP.
Teses fixadas pelo STJ:
1: A confissão extrajudicial somente será admissível no processo judicial se feita formalmente e de maneira documentada, dentro de um estabelecimento estatal público e oficial. Tais garantias não podem ser renunciadas pelo interrogado e, se alguma delas não for cumprida, a prova será inadmissível. A inadmissibilidade permanece mesmo que a acusação tente introduzir a confissão extrajudicial no processo por outros meios de prova (como, por exemplo, o testemunho do policial que a colheu).
2: A confissão extrajudicial admissível pode servir apenas como meio de obtenção de provas, indicando à polícia ou ao Ministério Público possíveis fontes de provas na investigação, mas não pode embasar a sentença condenatória.
3: A confissão judicial, em princípio, é, obviamente, lícita.
Todavia, para a condenação, apenas será considerada a confissão que encontre algum sustento nas demais provas, tudo à luz do art. 197 do CPP.
A aplicação dessas teses fica restrita aos fatos ocorridos a partir do dia seguinte à publicação deste acórdão no DJe. Modulação temporal necessária para preservar a segurança jurídica (art. 927, § 3º, do CPC).
Dentre a vasta produção doutrinária internacional sobre a valoração racional da prova, dois critérios principais têm especial aplicação ao exame da confissão (sem prejuízo, é claro, de outras regras de racionalidade): (I) o da corroboração e (II) o da completude, ambos enquadráveis nos arts. 197 e 200 do CPP.
Por corroboração, refere-se ao grau de existência de elementos de prova independentes capazes de dar sustento a uma afirmação, de modo que uma hipótese restará mais ou menos corroborada em direta proporção com a quantidade e qualidade das provas que se encaixam em suas predições.
O critério da completude, por outro lado, diz respeito à abrangência da coleta de provas e seu ingresso nos autos processuais, referindo-se à proporção entre as provas produzidas pela acusação e aquelas que seriam em tese relevantes e pertinentes.
Os conceitos valorativos até aqui trabalhados se relacionam de maneira dinâmica: ao perder a chance de apresentar provas que corroborem independentemente sua tese, a acusação gera uma incompletude no conjunto probatório que priva o Judiciário e a sociedade da melhor prova possível para o esclarecimento do crime. Isso aumenta desproporcionalmente o grau de incerteza ínsito a toda decisão sobre fatos passados, de uma maneira capaz de criar dúvida objetiva quanto a qualquer decreto condenatório e impor, como consequência, a absolvição do réu.
Elevar o standard a ser vencido pela acusação no exame de confissões terá, assim, o efeito benéfico de incentivar um maior profissionalismo na atuação policial e ministerial, com condenações mais seguras e justas.
AREsp 2.123.334-MG, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 20/6/2024, DJe 2/7/2024. Informativo nº 819 do STJ.
É incompatível com a Constituição Federal de 1988 — por ofensa ao princípio da isonomia (CF/1988, arts. 3º, IV; e 5º, “caput”) — a previsão contida no inciso VII do art. 295 do Código de Processo Penal (CPP) que concede o direito a prisão especial, até decisão penal definitiva, a pessoas com diploma de ensino superior.
A extensão da prisão especial a essas pessoas caracteriza verdadeiro privilégio que, em última análise, materializa a desigualdade social e o viés seletivo do direito penal, em afronta ao preceito fundamental da Constituição que assegura a igualdade entre todos na lei e perante a lei.
ADPF 334/DF, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 31.3.2023. Informativo nº 1.089 do STF.
A decretação de prisão temporária somente é cabível quando:
(i) for imprescindível para as investigações do inquérito policial;
(ii) houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado;
(iii) for justificada em fatos novos ou contemporâneos;
(iv) for adequada à gravidade concreta do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do indiciado; e
(v) não for suficiente a imposição de medidas cautelares diversas.
A prisão temporária não pode ser utilizada como meio de prisão para averiguação ou em violação ao direito à não autoincriminação, pois caracteriza abuso de autoridade, na medida em que representa instrumento utilizado como forma manifesta de constrangimento, impondo, por vias transversas, a submissão da pessoa em prestar depoimento na fase inquisitorial; ou quando fundada tão somente porque o representado não possui residência fixa, o que vai de encontro ao princípio constitucional da igualdade em sua dimensão material, já que essa circunstância pode revelar-se como uma situação de vulnerabilidade econômico-social.
Além disso, o rol do inciso III do artigo 1º da Lei 7.960/1989 é taxativo e representa opção do Poder Legislativo, que, dentro de sua competência constitucional precípua, conferiu especial atenção a determinados crimes, de modo compatível com a Constituição Federal de 1988 (CF/1988).
ADI 3360/DF, ADI 4109/DF, relatora Min. Cármen Lúcia, redator para o acórdão Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 11.2.2022. Informativo nº 1.043 do STF.
O corréu delatado deve apresentar memoriais escritos somente
após o decurso do prazo oferecido para a apresentação dessa peça aos corréus
colaboradores.
Inexistente dispositivo processual expresso, é evidente que,
sob pena de nulidade, os réus colaboradores não podem se manifestar por último,
em razão da carga acusatória que existe em suas informações.
HC 157627 AgR/PR, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o
ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 27.8.2019. Informativo nº 949 do
STF.
Compete à Justiça Eleitoral julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhes forem conexos.
Em face da alegada prática de crime eleitoral e delitos comuns conexos, fica caracterizada a competência da Justiça Eleitoral, considerado o princípio da especialidade. A Justiça especializada, nos termos do art. 35, II, do Código Eleitoral e do art. 78, IV, do Código de Processo Penal (CPP), por prevalecer sobre as demais, alcança os delitos de competência da Justiça comum.
A Constituição Federal (CF), no art. 109, IV, ao estipular a competência criminal da Justiça Federal, ressalva, expressamente, os casos da competência da Justiça Eleitoral e, consoante o caput do art. 121, a definição da competência daquela Justiça especializada foi submetida à legislação complementar. A ressalva do art. 109, IV, e a interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais afastam a competência da Justiça comum, federal ou estadual, e, ante a conexão, implicam a configuração da competência da Justiça Eleitoral em relação a todos os delitos.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também firmou entendimento no sentido de caber à Justiça Eleitoral processar e julgar crimes eleitorais e delitos comuns a eles conexos. Em outro julgado (AP 865 AgR), a Corte Especial do STJ assentou, ainda, competir à própria Justiça Eleitoral reconhecer a existência, ou não, do vínculo de conexidade entre delito eleitoral e crime comum a ele supostamente vinculado.
Inq 4435
AgR-quarto/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 13 e 14.3.2019. Informativo
nº 933 do STF.
A Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar crime comum conexo com crime eleitoral, ainda que haja o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva do delito eleitoral.
RHC 177243/MG, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento em 29.6.2021. Informativo nº 1.024 do STF.
É vedado às unidades federativas instituir normas que condicionem a instauração de ação penal contra governador por crime comum à previa autorização da casa legislativa, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) dispor, fundamentadamente, sobre a aplicação de medidas cautelares penais, inclusive afastamento do cargo.
O afastamento do governador não é automático no caso de abertura de ação penal. O simples recebimento de uma denúncia, ato de baixa densidade decisória, não pode importar em afastamento automático do governador. Esse afastamento somente pode ocorrer se o STJ entender que há elementos a justificá-lo. O governador pode ser afastado, mas não como decorrência automática do recebimento da denúncia.
ADI
4764/AC, ADI
4797/MT, ADI 4798/PI, rel. Min. Celso de Mello, red. p/ o ac.
Min. Roberto Barroso, julgamento em 4.5.2017.
DIREITO TRIBUTÁRIO
O princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal, se aplica às hipóteses de redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais que resultem em majoração indireta de tributos, observadas as determinações e as exceções constitucionais para cada tributo
O princípio da anterioridade busca assegurar a previsibilidade da relação fiscal, de modo a evitar que o sujeito passivo seja surpreendido com um aumento súbito de encargo, sem a possibilidade de planejamento financeiro.
RE 1473645 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 21-03-2025, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-136 DIVULG 28-04-2025 PUBLIC 29-04-2025. Tema nº 1.383 RG.
São constitucionais as taxas estaduais pela utilização, efetiva ou potencial, dos serviços públicos de prevenção e combate a incêndios, busca, salvamento ou resgate prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição pelos corpos de bombeiros militares
É constitucional — e está em consonância com os artigos 144, § 5º, e 145, inciso II, da Constituição Federal — lei estadual que prevê a cobrança de taxas pela utilização, efetiva ou potencial, dos serviços públicos de prevenção e combate a incêndios, busca, salvamento ou resgate prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição pelo Corpo de Bombeiros Militar.
O Tribunal também se manifestou sobre a especificidade e a divisibilidade do serviço de combate a incêndio (3), sendo aplicável o mesmo entendimento quanto aos serviços de busca, salvamento e resgate. Em regra, todos esses serviços podem ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidades públicas, bem como são suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários. Ademais, reforça esse entendimento, a existência, bastante comum, de empresas privadas que exploram esses serviços economicamente e cobram um preço pela atividade prestada a seus clientes.
É inconstitucional — pois usurpa a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte (CF/1988, art. 22, XI) — lei estadual que dispõe sobre a cobrança de taxa de vistoria veicular para verificação de equipamentos de proteção contra incêndio.
É inconstitucional — por violar o art. 5º, XXXIV, alínea “b”, da Constituição Federal — a cobrança de taxa para emissão de certidões, desde que estas se voltem para a defesa de direitos ou o esclarecimento de situação de interesse pessoal.
O STF ainda reconheceu haver imunidade tributária na hipótese de obtenção de certidões em repartições públicas para defesa de direitos ou esclarecimento de situações de interesse pessoal. Isso não impede, entretanto, a instituição de taxa para o fornecimento de fotocópias e reproduções de documentos pelo órgão ou entidade pública consultada para o ressarcimento dos gastos com material utilizado, bem como a cobrança de taxa para emissão de atestado coletivo ou individual de interesse de empresa privada.
RE 1.417.155/RN, ADPF 1.028/PE, ADPF 1.029/RJ, relator Ministro Edson Fachin, julgamento finalizado em 26.03.2025 (quarta-feira). Informativo nº 1.171 do STF.
A partir da expedição do auto de arrematação, assinado pelo juiz, leiloeiro e arrematante, este torna-se responsável pelo pagamento dos tributos do imóvel, ainda que postergada a respectiva imissão na posse
Segundo o disposto no art. 130 do Código Tributário Nacional (CTN), quando arrematado o bem imóvel em hasta pública, os créditos relativos a impostos devidos em razão da propriedade sub-rogam-se no preço, descabendo a responsabilização do adquirente pelos tributos devidos até esse momento.
A partir da assinatura do auto de arrematação caracteriza-se a propriedade em favor do arrematante, a quem incumbe tomar as providências necessárias à consolidação desse status e ficando responsável pelos débitos de IPTU posteriores à arrematação, ainda que postergada a respectiva imissão na posse.
AgInt no AREsp 2.689.401-PE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 24/2/2025, DJEN 28/2/2025. Informativo do STJ - Edição Extraordinária nº 25.
As multas tributárias aplicadas em virtude de sonegação, fraude ou conluio devem se limitar a 100% da dívida tributária, sendo possível que o montante chegue a 150% da dívida em caso de reincidência. Esse é o panorama que deve prevalecer até que seja editada a lei complementar federal pertinente sobre a matéria (CF/1988, art. 146, III), apta a regulamentar o tema em todo o País.
Tese fixada:
Até que seja editada lei complementar federal sobre a matéria, a multa tributária qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio limita-se a 100% (cem por cento) do débito tributário, podendo ser de até 150% (cento e cinquenta por cento) do débito tributário caso se verifique a reincidência definida no art. 44, § 1º-A, da Lei nº 9.430/1996, incluído pela Lei nº 14.689/2023, observando-se, ainda, o disposto no § 1º-C do citado artigo.
RE 736.090/SC, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento finalizado em 03.10.2024 (quinta-feira). Tema 863 RG. Informativo nº 1.153 do STF.
A restituição de indébito tributário reconhecido na via judicial não pode ser efetivada administrativamente, eis que deve plena observância ao regime constitucional de precatórios (CF/1988, art. 100).
Os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação.
RE 1.420.691/SP, relatora Ministra Presidente, julgamento finalizado no Plenário Virtual em 21.8.2023. Tema 1.262 RG. Informativo nº 1.108 do STF.
É constitucional a concessão de isenção de ICMS na aquisição de veículos por pessoas com deficiência, desde que haja expressa autorização em convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), ainda que em momento posterior à edição da lei estadual originária, devidamente alterada por uma nova legislação.
ADI 3.495/ES, relator Ministro Cristiano Zanin, julgamento virtual finalizado em 16.08.2024 (sexta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.146 do STF.
Considera-se fraudulenta a alienação, mesmo quando há transferências sucessivas do bem, feita após a inscrição do débito em dívida ativa, sendo desnecessário comprovar a má-fé do terceiro adquirente
Não incide a Súmula n. 375/STJ em sede de Execução Fiscal.
O art. 185 do CTN, seja em sua escrita original ou na redação dada pela LC n. 118/2005, não prevê, como condição de presunção da fraude à execução fiscal, a prova do elemento subjetivo da fraude perpetrada, qual seja, o consilium fraudis.
Ao contrário, estabeleceu-se que a constatação da fraude deve se dar objetivamente, sem se indagar da intenção dos partícipes do negócio jurídico.
Assim, "considera-se fraudulenta a alienação, mesmo quando há transferências sucessivas do bem, feita após a inscrição do débito em dívida ativa, sendo desnecessário comprovar a má-fé do terceiro adquirente" (AgInt no REsp n. 1.820.873/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 25/4/2023, DJe de 23/5/2023).
AgInt no AREsp 930.482-SP, Rel. Ministro. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 8/8/2023.
Sociedade de economia mista estadual prestadora exclusiva do serviço público de abastecimento de água potável e coleta e tratamento de esgotos sanitários faz jus à imunidade tributária recíproca sobre impostos federais incidentes sobre patrimônio, renda e serviços.
Prevalece no STF o entendimento de que, para a extensão da imunidade tributária recíproca da Fazenda Pública a sociedades de economia mista e empresas públicas, é necessário preencher 3 (três) requisitos:
(i) a prestação de um serviço público;
(ii) a ausência do intuito de lucro; e
(iii) a atuação em regime de exclusividade, ou seja, sem concorrência.
ACO 3410/SE, relator Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 20.4.2022 (quarta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.051 do STF.
As organizações assistenciais religiosas podem ser abrangidas pela imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, da CF/1988.
As entidades religiosas podem se caracterizar como instituições de assistência social a fim de se beneficiarem da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, ‘c’, da Constituição, que abrangerá não só os impostos sobre o seu patrimônio, renda e serviços, mas também os impostos sobre a importação de bens a serem utilizados na consecução de seus objetivos estatutários.
A condição é que os recursos obtidos sejam vertidos ao implemento de tais fins. Havendo correspondência entre o recurso obtido e a aplicação nas finalidades essenciais, restará configurado o liame exigido pelo texto constitucional. Dessa forma, o alcance da imunidade é determinado pela destinação dos recursos auferidos pela entidade, e não pela origem ou natureza da renda.
RE 630790/SP, relator Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 18.3.2022 (sexta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.047 do STF.
É constitucional o art. 40 da Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF), tendo natureza processual o prazo de um ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de cinco anos
É constitucional — por não afrontar a exigência de lei complementar para tratar da matéria (CF/1988, art. 146, III, “b”) — o art. 40 da LEF (1) — lei ordinária nacional — quanto à prescrição intercorrente tributária e ao prazo de um ano de suspensão da execução fiscal. Contudo, o § 4º do aludido dispositivo deve ser lido de modo que, após o decurso do prazo de um ano de suspensão da execução fiscal, a contagem do prazo de prescrição de cinco anos seja iniciada automaticamente.
O dispositivo impugnado, embora positivado mediante lei ordinária, não extrapola a norma constitucional a que atende. Ao estabelecer o termo inicial para a prescrição intercorrente, ele apenas prevê um marco processual para a contagem do prazo, sem que deixe de observar o prazo de cinco anos, estabelecido na Lei 5.172/1966 (Código Tributário Nacional - CTN). Em outras palavras, o legislador ordinário se limitou a transpor o modelo estabelecido no art. 174 do CTN (3), adaptando-o às particularidades da prescrição observada no curso de uma execução fiscal.
No entanto, impedir o início automático da contagem do prazo da prescrição intercorrente — após o término da suspensão — pode acarretar a eternização das execuções fiscais, em contrariedade aos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, bem como à exigência da razoável duração do processo, o que justifica a necessidade de se conferir interpretação conforme a Constituição ao § 4º do art. 40 da LEF.
RE 636.562/SC, relator Ministro Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 17.2.2023. Tema 390 RG. Informativo nº 1.083 do STF.
Incide o Imposto sobre serviços (ISS) no licenciamento ou na cessão de direito de uso de softwares desenvolvidos para clientes de forma personalizada, mesmo quando o serviço seja proveniente do exterior ou sua prestação tenha se iniciado no exterior.
RE 688223/PR, relator Min. Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 3.12.2021 (sexta-feira), às 23:59. Tema 590 RG. Informativo nº 1.040 do STF.
Incide apenas o imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS), e não o imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS), nas operações envolvendo o fornecimento de programas de computador mediante contrato de licenciamento ou cessão do direito de uso, tanto para os “softwares” padronizados quanto para aqueles produzidos por encomenda e independentemente do meio utilizado para a transferência, seja por meio de “download” ou por acesso em nuvem.
ADI 5659/MG, relator Min. Dias Toffoli, julgamento finalizado em 24.2.2021
ADI 1945/MT, relatora Min. Cármen Lúcia, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgamento finalizado em 24.2.2021
O concurso de preferência entre os entes federados na cobrança judicial dos créditos tributários e não tributários, previsto no parágrafo único do art. 187 da Lei 5.172/1966 (Código Tributário Nacional) e no parágrafo único do art. 29 da Lei 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais), não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 (CF/1988).
Isso porque ameaça o pacto federativo e contraria o inc. III do art. 19 da CF/1988 a definição de hierarquia na cobrança judicial dos créditos da dívida pública da União aos estados e Distrito Federal e esses aos Municípios.
A autonomia e a isonomia dos entes federados são os alicerces para a manutenção do modelo jurídico-constitucional adotado.
ADPF 357/DF, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento em 24.6.2021. Informativo nº 1.023 do STF.
Incide ISS sobre as operações de venda de medicamentos preparados por farmácias de manipulação sob encomenda. Incide ICMS sobre as operações de venda de medicamentos por elas ofertados aos consumidores em prateleira.
RE 605.552. Relator: Min. Dias Toffoli. Plenário, Sessão Virtual de 26.6.2020 a 4.8.2020. Tema 379 da repercussão geral. Informativo nº 994 do STF.
É taxativa a lista de serviços sujeitos ao ISS a que se refere o art. 156, III, da Constituição Federal, admitindo-se, contudo, a incidência do tributo sobre as atividades inerentes aos serviços elencados em lei em razão da interpretação extensiva.
RE 784.439. Relatora: Min. Rosa Weber. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020. Tema 296 da repercussão geral. Informativo nº 991 do STF.
A imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal, não abarca o maquinário utilizado no processo de produção de livros, jornais e periódicos.
ARE 1100204/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 29.5.2018.
A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante, para a verificação da existência do beneplácito constitucional, a repercussão econômica do tributo envolvido.
Não é possível estender ao particular vendedor (contribuinte de direito) a imunidade tributária subjetiva que detém o adquirente de mercadoria (contribuinte de fato).
Assim, o beneficiário da imunidade tributária subjetiva na posição de simples contribuinte de fato, embora possa arcar com os ônus financeiros dos impostos envolvidos nas compras de mercadorias, caso tenham sido transladados pelo vendedor contribuinte de direito, desembolsa importe que juridicamente não se qualifica como tributo, mas sim preço, decorrente de uma relação contratual.
É impossível, no contexto do exercício das atividades econômicas, ter-se certeza da efetiva transferência do encargo financeiro dos tributos, em razão de o lucro não ser tabelado.
RE 608872/MG, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 22 e 23.2.2017. Informativo nº 855 do STF.
DIREITO EMPRESARIAL
Exaurido o stay period, compete ao Juízo trabalhista a execução de crédito trabalhista extraconcursal, sendo vedado ao Juízo da recuperação judicial proceder ao controle dos atos constritivos a serem exarados.
CC 191.533-MT, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por maioria, julgado em 18/4/2024, DJe 26/4/2024.
Ao produtor rural que exerça sua atividade de forma empresarial há mais de dois anos, é facultado requerer a recuperação judicial, desde que esteja inscrito na Junta Comercial no momento em que formalizar o pedido recuperacional, independentemente do tempo de seu registro.
REsp 1.905.573-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/06/2022, DJe 03/08/2022. Tema 1145. Informativo nº 743 do STJ.
O crédito fiscal não tributário não se submete aos efeitos do plano de recuperação judicial.
REsp 1.931.633-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 03/08/2021.
É absoluta a competência do local em que se encontra o principal estabelecimento para processar e julgar pedido de recuperação judicial, que deve ser aferido no momento de propositura da demanda, sendo irrelevantes para esse fim modificações posteriores de volume negocial.
CC 163.818-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/09/2020, DJe 29/09/2020.
DIREITO DO CONSUMIDOR
O policial militar é equiparado a consumidor em casos de acidente com arma de fogo defeituosa, aplicando-se o prazo prescricional quinquenal do Código de Defesa do Consumidor
Para eliminar qualquer dúvida sobre quem deve ser considerado consumidor em caso de acidente de consumo, o art. 17 equipara "aos consumidores todas as vítimas do evento".
No contexto em que o policial é ferido por portar arma de fogo com defeito de fabricação, ele se torna consumidor por equiparação, tendo em vista ser o destinatário final do produto e o que sofre as consequências diretas de sua inadequação. Ao se reconhecer o policial como consumidor bystander, promove-se uma interpretação mais ampla do conceito de consumo, prevenindo que pessoas em situações similares fiquem desprotegidas em casos de danos causados por produtos defeituosos.
Portanto, a responsabilidade da fabricante da arma de fogo deve ser analisada sob a perspectiva do fato do produto, independentemente da natureza jurídica da relação contratual com a entidade adquirente.
REsp 1.948.463-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/2/2025.
É válida a comunicação escrita, conforme prevê o art. 43, § 2º, do CDC, enviada por carta ou e-mail, para fins de notificação do consumidor acerca da inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes, desde que os dados do consumidor sejam fornecidos pelo credor ao órgão mantenedor do cadastro de inadimplentes.
REsp 2.158.450-RS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por maioria, julgado em 10/12/2024.
Nos tratamentos de caráter continuado, deverão ser observadas, a partir da sua vigência, as inovações trazidas pela Lei n. 14.454/2022, diante da aplicabilidade imediata da lei nova
Quando do julgamento dos EREsps n. 1.886.929/SP e 1.889.704/SP, a Segunda Seção do STJ uniformizou o entendimento de ser o Rol da ANS, em regra, taxativo, podendo ser mitigado quando atendidos determinados critérios.
A Lei n. 14.454/2022 promoveu alteração na Lei n. 9.656/1998 (art. 10, § 13) para estabelecer critérios que permitam a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar. Com essa edição legislativa o Rol da ANS passou por sensíveis modificações em seu formato, suplantando a eventual oposição rol taxativo/rol exemplificativo.
A superveniência desse novo diploma legal foi capaz de fornecer nova solução legislativa, antes inexistente, provocando alteração substancial do complexo normativo. Ainda que se quisesse cogitar, erroneamente, que a modificação legislativa havida foi no sentido de trazer uma "interpretação autêntica", ressalta-se que o sentido colimado não vigora desde a data do ato interpretado, mas apenas opera efeitos ex nunc, já que a nova regra modificadora ostenta caráter inovador.
Embora a lei nova não possa, em regra, retroagir, é possível a sua aplicação imediata, ainda mais em contratos de trato sucessivo. Assim, nos tratamentos de caráter continuado, deverão ser observadas, a partir da sua vigência, as inovações trazidas pela Lei n. 14.454/2022, diante da aplicabilidade imediata da lei nova.
Dessa forma, mantém-se a jurisprudência da Segunda Seção do STJ, que uniformizou a interpretação da legislação da época, devendo incidir aos casos regidos pelas normas que vigoravam quando da ocorrência dos fatos, podendo a nova lei incidir, a partir de sua vigência, aos fatos daí sucedidos.
REsp 2.037.616-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 24/4/2024, DJe 8/5/2024.
A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.
O art. 42, parágrafo único, do CDC, dispõe que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Ou seja, demonstrado na relação de consumo o pagamento de cobrança indevida, a restituição do indébito dar-se-á em dobro, ressalvado se o fornecedor provar, no caso concreto, o engano justificável.
A norma analisada não exige culpa, dolo ou má-fé do fornecedor, quando este cobra e recebe valor indevido do consumidor. Ao fornecedor, a imputação que se lhe faz a lei é objetiva, independentemente de culpa ou dolo. Assim, a justificabilidade (ou legitimidade) do engano, para afastar a devolução em dobro, insere-se no domínio da causalidade, e não no domínio da culpabilidade, pois esta se resolve, sem apelo ao elemento volitivo, pelo prisma da boa-fé objetiva.
EAREsp 1.501.756-SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/2/2024.
O simples fato de o consumidor registrar negativação nos cadastros de consumidores não pode bastar, por si só, para vedar a contratação do plano de saúde pretendido
O fato de o consumidor registrar negativação nos cadastros de consumidores não pode bastar, por si só, para vedar a contratação do plano de saúde pretendido. A prestação dos serviços sempre pode ser obstada se não tiver havido o pagamento correspondente. Assim, exigir que a contratação seja efetuada apenas mediante "pronto pagamento", nos termos do que dispõe o art. 39, IX, do CDC, equivale a impor ao consumidor uma desvantagem manifestamente excessiva, o que é vedado pelo art. 39, V, do mesmo diploma. E ainda, em se considerando que o fornecimento (ou o atendimento pelo plano de saúde) só persistirá se houver o efetivo adimplemento das prestações contratadas.
Ademais, a recusa da contratação ou a exigência de que só seja feita mediante "pronto pagamento", excede aos limites impostos pelo fim econômico do direito e pela boa-fé (art. 187 do CC/2002).
A contratação de serviços essenciais não mais pode ser vista pelo prisma individualista ou de utilidade do contratante, mas pelo sentido ou função social que tem na comunidade.
REsp 2.019.136-RS, Rel. Ministro Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por maioria, julgado em 7/11/2023, DJe 23/11/2023.
Não se pode responsabilizar instituição financeira em caso de transações realizadas mediante a apresentação de cartão físico com chip e a senha pessoal do correntista, sem indícios de fraude
As Turmas de Direito Privado do STJ têm decidido que cabe ao correntista, em caso de eventuais saques irregulares na conta, feitos com o cartão e a senha cadastrada pelo consumidor, a prova de que o banco agiu com negligência, imperícia ou imprudência na entrega do dinheiro.
Para o STJ, basta à instituição financeira comprovar que o saque foi feito com o cartão do cliente e a respectiva senha, não tendo que demonstrar que foi ele pessoalmente que efetuou a retirada.
Ressalta-se que, ainda que comprovado que não foi o autor, nem outra pessoa por ele autorizada, que realizou os saques, ainda assim, ressalvada a excepcionalidade de saques atípicos, não poderia a instituição financeira ser responsabilizada.
Ao se tornar cliente de qualquer banco, o correntista assume inteira responsabilidade por sua senha e pelo cartão magnético.
REsp 1.898.812-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023.
A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, não é possível a responsabilização pessoal de sócio que não desempenhe atos de gestão, ressalvada a prova de que contribuiu, ao menos culposamente, para a prática de atos de administração
Assim, a denominada Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, de que trata o § 5º do art. 28 do CDC, a despeito de dispensar a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não dá margem para admitir a responsabilização pessoal I) de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que nela atue como gestor, e II) de quem, embora ostentando a condição de sócio, não desempenha atos de gestão, independentemente de se tratar ou não de empresa constituída sob a forma de cooperativa.
Vale lembrar que a desconsideração, mesmo sob a vertente da denominada Teoria Menor é uma exceção à regra da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas.
REsp 1.900.843-DF, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (in memorian), Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria julgado em 23/5/2023, DJe 30/5/2023.
Cabe à Justiça comum estadual e/ou distrital processar e julgar as demandas oriundas de ações de repactuação de dívidas decorrentes de superendividamento, ainda que exista interesse de ente federal, como a Caixa Econômica Federal
De fato, o procedimento judicial relacionado ao superendividamento, tal como o de recuperação judicial ou falência, possui inegável e nítida natureza concursal, de modo que as empresas públicas federais, excepcionalmente, sujeitam-se à competência da Justiça estadual e/ou distrital, justamente em razão da existência de concursalidade entre credores, impondo-se, dessa forma, a concentração, na Justiça comum estadual, de todos os credores, bem como o próprio consumidor para a definição do plano de pagamento, suas condições, o seu prazo e as formas de adimplemento dos débitos.
Eventual desmembramento ensejará notável prejuízo ao devedor (consumidor vulnerável, reitere-se), porquanto, consoante dispõe a própria legislação de regência (art. 104-A do CDC), todos os credores devem participar do procedimento, inclusive na oportunidade da audiência conciliatória. Caso tramitem separadamente, em jurisdições diversas, federal e estadual, estaria maculado o objetivo primário da Lei do Superendividamento, qual seja, o de conferir a oportunidade do consumidor - perante seus credores - de apresentar plano de pagamentos a fim de quitar suas dívidas/obrigações contratuais. Haverá o risco de decisões conflitantes entre os juízos acerca dos créditos examinados, em violação ao comando do art. 104-A do CDC.
CC 193.066-DF, Relator Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/3/2023.
É de cobertura obrigatória pela operadora de plano de saúde, o medicamento que, apesar de não registrado pela ANVISA, teve a sua importação excepcionalmente autorizada pela referida Agência Nacional
A autorização da ANVISA para a importação excepcional do medicamento para uso próprio sob prescrição médica, é medida que, embora não substitua o devido registro, evidencia a segurança sanitária do fármaco.
REsp 1.943.628-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/10/2021, DJe 03/11/2021. Informativo nº 717 do STJ.
A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor é regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer antes da etapa instrutória ou, quando proferida em momento posterior, há que se garantir à parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas, sob pena de absoluto cerceamento de defesa.
REsp 1.286.273-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 08/06/2021.
É lícita a exclusão, na Saúde Suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo os antineoplásicos orais (e correlacionados), a medicação assistida (home care) e os incluídos no rol da Agência Nacional de Saúde para esse fim.
REsp 1.692.938/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 27/04/2021. Informativo nº 694 do STJ.
É devida a cobertura, pela operadora de plano de saúde, do procedimento de criopreservação de óvulos de paciente fértil, até a alta do tratamento quimioterápico, como medida preventiva à infertilidade
Segundo a jurisprudência do STJ, não caberia a condenação da operadora de plano de saúde a custear criopreservação como procedimento inserido num contexto de mera reprodução assistida.
O caso concreto, porém, revela a necessidade de atenuação dos efeitos colaterais, previsíveis e evitáveis, da quimioterapia, dentre os quais a falência ovariana, em atenção ao princípio médico "primum, non nocere" e à norma que emana do art. 35-F da Lei n. 9.656/1998, segundo a qual a cobertura dos planos de saúde abrange também a prevenção de doenças, no caso, a infertilidade.
Nessa hipótese, é possível a manutenção da condenação da operadora à cobertura de parte do procedimento pleiteado, como medida de prevenção para a possível infertilidade da paciente, cabendo à beneficiária arcar com os eventuais custos do procedimento a partir da alta do tratamento quimioterápico.
Ressalte-se a distinção entre o caso dos autos, em que a paciente é fértil e busca a criopreservação como forma de prevenir a infertilidade, daqueles em que a paciente já é infértil, e pleiteia a criopreservação como meio para a reprodução assistida, casos para os quais não há obrigatoriedade de cobertura.
REsp 1.815.796-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020. Informativo nº 673 do STJ.
A operadora de plano de saúde não pode negar o fornecimento de tratamento prescrito pelo médico, sob o pretexto de que a sua utilização em favor do paciente está fora das indicações descritas na bula/manual registrado na ANVISA (uso off-label)
É o médico, e não a operadora do plano de saúde, o responsável pela orientação terapêutica adequada ao paciente.
REsp 1.721.705-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 28/08/2018, DJe 06/09/2018.
Quando o contrato de plano de saúde incluir atendimento obstétrico, a operadora tem o dever de prestar assistência ao recém-nascido durante os primeiros trinta dias após o parto
Quando o contrato de plano de saúde incluir atendimento obstétrico, a operadora tem o dever de prestar assistência ao recém-nascido durante os primeiros trinta dias após o parto (art. 12, III, "a", da Lei n. 9.656/1998), independentemente de a operadora ter autorizado a efetivação da cobertura, ter ou não custeado o parto, tampouco de inscrição do neonato como dependente nos trinta dias seguintes ao nascimento.
REsp 1.269.757-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/5/2016, DJe 31/5/2016. Informativo nº 584 do STJ.
DIREITO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE
A aplicação do art. 942 do CPC em procedimentos infracionais deve garantir julgamento ampliado apenas em hipóteses de divergência desfavorável ao adolescente infrator
Seria logicamente incompatível, portanto, e mesmo constitucionalmente inadmissível, negar semelhante garantia processual aos adolescentes submetidos ao procedimento infracional, cuja vulnerabilidade e especial proteção são constitucionalmente reforçadas (art. 227 da Constituição Federal e arts. 100 e 106 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA). Tratar-se-ia de clara violação ao princípio constitucional da isonomia (art. 5º, caput, da Constituição Federal), pois significaria atribuir tratamento processual mais gravoso e menos protetivo justamente aos sujeitos que merecem, em razão de sua condição peculiar de desenvolvimento, uma proteção diferenciada e prioritária.
Nesse sentido, destaca-se ainda o princípio da proteção integral, que exige interpretação extensiva e protetiva em todas as matérias relativas à infância e juventude.
AgRg no REsp 2.200.245-RS, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 20/5/2025. Informativo nº 851 do STJ.
Em se tratando de menor de idade, além das balizas fixadas na Súmula Vinculante nº 11, a necessidade de utilização de algemas apresentada pela autoridade policial deve ser avaliada pelo Ministério Público e submetida ao Conselho Tutelar, que se manifestará a respeito das providências relatadas
O uso de algemas é medida excepcional e que deve ser fundamentada para evitar abusos pelas autoridades. Nesse contexto, as seguintes condições também devem obrigatoriamente ser observadas quando se tratar de adolescente menor de dezoito anos:
(i) uma vez apreendido e não sendo o caso de liberação, o menor será encaminhado ao representante do Ministério Público competente (ECA/1990, art. 175), que deverá avaliar e opinar sobre a eventual necessidade de utilização de algemas apontada pela autoridade policial que estiver realizando a diligência em questão;
(ii) não sendo possível a apresentação imediata do menor ao órgão ministerial, ele será encaminhado à entidade de atendimento especializada, que deverá apresentá-lo em vinte e quatro horas ao representante do Parquet (ECA/1990 art. 175, § 1º);
(iii) nas localidades em que não houver entidade de atendimento especializada para receber o menor apreendido, ele ficará aguardando a apresentação ao representante do Ministério Público em repartição policial especializada e, na falta desta, em dependência separada da destinada a maiores (ECA/1990, art. 175, § 2º), não podendo assim permanecer por mais de vinte e quatro horas (1);
(iv) apresentado o menor ao representante do Parquet e emitido o parecer sobre a eventual necessidade de utilização das algemas, essa questão será submetida à autoridade judiciária que deverá se manifestar de forma motivada sobre a matéria no momento da audiência de apresentação do menor; e
(v) o Conselho Tutelar deverá ser instado a se manifestar sobre as providências relatadas pela autoridade policial, para decisão final do Ministério Público.
Rcl 61.876/RJ. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Julgamento finalizado em 07/05/2024. Informativo 1.136 do STF.
A previsão expressa no ECA da contagem dos prazos nos ritos nela regulados em dias corridos impede a aplicação subsidiária do art. 219 do CPC/2015, que prevê o cálculo em dias úteis.
HC 475.610-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 26/03/2019, DJe 03/04/2019.
Mesmo diante da interposição de recurso de apelação, é possível o imediato cumprimento de sentença que impõe medida socioeducativa de internação, ainda que não tenha sido imposta anterior internação provisória ao adolescente
Desse modo, postergar o início de cumprimento da medida socioeducativa imposta na sentença que encerra o processo por ato infracional importa em "perda de sua atualidade quanto ao objetivo ressocializador da resposta estatal, permitindo a manutenção dos adolescentes em situação de risco, com a exposição aos mesmos condicionantes que o conduziram à prática infracional".
HC 346.380-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 13/4/2016, DJe 13/5/2016. Informativo nº 583 do STJ. No mesmo sentido: AgRg no HC n. 861.495/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 18/3/2024, DJe de 20/3/2024.
DIREITO AMBIENTAL
É imprescritível a pretensão executória e inaplicável a prescrição intercorrente na execução de reparação de dano ambiental, ainda que posteriormente convertida em indenização por perdas e danos.
Diante do caráter transindividual, transgeracional e indisponível do bem jurídico protegido, é imprescritível a pretensão executória referente a título executivo judicial que reconhece a obrigação de reparação do dano ambiental, mesmo após a conversão da obrigação em prestação pecuniária.
ARE 1.352.872/SC, relator Ministro Cristiano Zanin, julgamento virtual finalizado em 28.03.2025 (sexta-feira), às 23:59. Informativo nº 1.171 do STF.
O expropriado não tem o dever de pagar pela reparação do dano ambiental no bem desapropriado, podendo responder, no entanto, por eventual dano moral coletivo.
O caso em análise se distingue da regra geral quanto à possibilidade de cobrar a reparação do dano tanto do proprietário atual quanto do anterior, visto que naquela hipótese se trata de aquisição derivada da propriedade (transferência voluntária), ao passo que aqui se está diante de aquisição originária por desapropriação, que tem contornos próprios e distintos.
O art. 31 do Decreto-Lei n. 3.365/1941 disciplina que "ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado".
Isso implica dizer que o ônus de reparação que recaía sobre o bem (de natureza histórico-cultural) expropriado já foi considerado no preço (justa indenização) que foi desembolsado pelo Município para a aquisição do imóvel, isto é, a Fazenda municipal já descontou o passivo ambiental do valor pago.
Diante desse quadro superveniente, a condenação da parte expropriada no dever de pagar pela reparação do imóvel desapropriado implicaria violação do postulado do non bis in idem, uma vez que o particular amargaria duplo prejuízo pelo mesmo fato: perceberia indenização já descontada em razão do passivo ambiental e ainda teria que pagá-lo (o passivo) novamente na ação civil pública.
AREsp 1.886.951-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por maioria, julgado em 11/6/2024, DJe 20/6/2024.
As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo possível exigi-las, à escolha do credor, do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores, ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente.
Situação que merece exame particularizado é a do anterior titular que não deu causa a dano ambiental ou a irregularidade. A hipótese pode ocorrer de duas formas. A primeira acontece quando o dano é posterior à cessação do domínio ou da posse do alienante, situação em que ele, em regra, não pode ser responsabilizado, a não ser que, e.g., tenha ele, mesmo já sem a posse ou a propriedade, retornado à área, a qualquer outro título, para degradá-la, hipótese em que responderá, como qualquer agente que realiza atividade causadora de degradação ambiental.
A segunda situação a ser examinada é a do anterior titular que conviveu com dano ambiental pré-existente, ainda que a ele não tenha dado causa, alienando o bem no estado em que o recebera. Nessa hipótese, não há como deixar de reconhecer a prática de omissão ilícita, na linha da jurisprudência do STJ, que por imperativo ético e jurídico não admite que aquele que deixou de reparar o ilícito, e eventualmente dele se beneficiou, fique isento de responsabilidade.
Em suma, o anterior titular não estará obrigado a reparar dano ambiental superveniente à cessação de sua propriedade ou posse, exceto se tiver concorrido para sua causação.
REsp 1.953.359-SP, REsp 1.962.089-MS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 14/9/2023. Tema 1204. Informativo nº 787 do STJ.
A responsabilidade administrativa ambiental é de natureza subjetiva
A aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano.
Em suma:
responsabilidade civil ambiental - natureza objetiva - independe de dolo ou culpa;
responsabilidade administrativa ambiental - natureza subjetiva - depende do dolo ou culpa;
responsabilidade penal ambiental - natureza subjetiva - depende do dolo ou culpa.
EREsp 1.318.051-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 08/05/2019, DJe 12/06/2019