É possível o tombamento de bem por meio de lei, cuja iniciativa pode ser parlamentar

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STF

É possível o tombamento de bem por meio de lei, cuja iniciativa pode ser parlamentar.


Ementa

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 312/2016, DO ESTADO DO AMAZONAS, QUE DISPÕE SOBRE O TOMBAMENTO DAS EFIFICAÇÕES DE PROJETOS DO ARQUITETO SEVERIANO MÁRIO VIEIRA DE MAGALHÃES PORTO. PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO-CULTURAL. ART. 216, § 1° DA CF. COMPETÊNCIA COMUM DE PROTEGER OBRAS E BENS. TOMBAMENTO PROVISÓRIO. ATO NORMATIVO DE EFEITOS CONCRETOS DO PODER LEGISLATIVO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RAZÕES PARA SUPERAÇÃO DO PRECEDENTE FIRMADO NO JULGAMENTO DA ACO 1.208-AGR/MS, REL. MIN. GILMAR MENDES. INOCORRÊNCIA DE INVASÃO DE COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO. POSTERIOR OBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO CONSTANTE DO DECRETO-LEI 25/1937. GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. I - A previsão constitucional de proteção do patrimônio histórico-cultural brasileiro possui relevante importância no direcionamento de criação de políticas públicas e de mecanismos infraconstitucionais para a sua concretização (art. 216, § 1° da CF). II - A Constituição outorgou a todas as unidades federadas a competência comum de proteger as obras e bens de valor histórico, artístico e cultural, compreendida nela a adoção de quaisquer medidas que se mostrem necessárias para promover e salvaguardar o patrimônio cultural brasileiro, incluindo-se o uso do instrumento do tombamento. III – Ao julgar a ACO 1.208-AgR/MS, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, suplantando entendimento anterior em sentido oposto, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, dentre outras deliberações, entendeu possível o tombamento de bem por meio de lei. IV - Assim, ainda que não tenha sido proferido em controle concentrado, entendo que não há razões para superar o entendimento firmado na ACO 1.208-AgR/MS, seja porque não houve discussões recentes a respeito do tema, seja porque transcorridos pouco mais de 3 anos daquele julgamento, cujo elevado score contou com apenas um voto divergente. V – O legislador estadual não invadiu a competência do Poder Executivo para tratar sobre a matéria, mas exerceu atribuição própria de iniciar o procedimento para tombar bens imóveis com a finalidade de proteger e promover o patrimônio cultural amazonense. VI - Com base no entendimento fixado na deliberação da ACO 1.208-AgR/MS, considera-se a Lei 312/2016, do Estado do Amazonas, de efeitos concretos, como o ato acautelatório de tombamento provisório a provocar o Poder Executivo local, o qual deverá perseguir, posteriormente, o procedimento constante do Decreto-Lei 25/1937, sem descurar da garantia da ampla defesa e do contraditório, previstas nos arts. 5° ao 9° do referido ato normativo. VII - O Poder Executivo, ainda que esteja compelido a levar adiante procedimento tendente a culminar no tombamento definitivo, não se vincula à declaração de reconhecimento do valor do bem como patrimônio cultural perfectibilizada pelo Poder Legislativo VIII - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

(ADI 5670, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 11-10-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-212  DIVULG 25-10-2021  PUBLIC 26-10-2021) Grifo nosso.


Questão da FGV

Em razão de uma grande mobilização da sociedade civil organizada, um grupo de parlamentares apresentou projeto de lei, que veio a ser aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado Alfa, daí resultando a publicação da Lei Estadual nº X. Por meio desse diploma normativo, foi declarado o tombamento de determinado imóvel, no qual funcionou uma instituição educacional de destacada importância para a coletividade. Na justificativa ao projeto, foi informado ter sido requerida, pelos proprietários, autorização para demolição do prédio. Irresignados com a declaração de tombamento, os proprietários do imóvel ingressaram com ação judicial para que fossem desobrigados de observar as limitações administrativas provisórias decorrentes da referida declaração, embasando-se na inconstitucionalidade da Lei Estadual nº X. 

O magistrado competente, ao apreciar a questão, observou corretamente que, na perspectiva da Constituição Federal de 1988: 

(A) há vício de iniciativa na Lei Estadual nº X, sendo, portanto, inconstitucional; 

(B) a matéria não poderia ser disciplinada por lei, por consubstanciar ato próprio do Poder Executivo; logo, a Lei Estadual nº X é inconstitucional; 

(C) a Lei Estadual nº X somente deve ser considerada constitucional caso haja lei complementar federal autorizando a sua edição pelo Estado Alfa; 

(D) a preservação da cultura é matéria de competência comum; logo, o Estado Alfa tem competência para legislar sobre a matéria, sendo a Lei Estadual nº X constitucional; 

(E) o tombamento está associado a um interesse local, o que atrai a competência dos municípios para dispor sobre a matéria, sendo a Lei Estadual nº X inconstitucional. 

Gabarito: D

É constitucional a legislação federal que estabelece sanções aplicáveis aos entes que descumprirem os critérios para a obtenção do equilíbrio atuarial dos regimes próprios de previdência social (RPPS)

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Teses fixadas pelo STF

1. É constitucional a previsão, em lei federal, de medidas sancionatórias ao ente federativo que descumprir os critérios e exigências aplicáveis aos regimes próprios de previdência social. 

2. Admite-se o controle judicial das exigências feitas pela União no exercício da fiscalização desses regimes. 

Nesse caso, o ente fiscalizado deverá demonstrar, de forma técnica: 

(i) a inexistência do déficit atuarial apontado; ou, 

(ii) caso reconheça o desequilíbrio, a impertinência das medidas impostas pela União e a existência de plano alternativo capaz de assegurar, de maneira equivalente, a sustentabilidade do regime.”


Ementa do "leading case"

Direito constitucional e previdenciário. Recurso Extraordinário. Tema nº 968 da Repercussão Geral. Descumprimento de normas gerais de organização e funcionamento dos regimes próprios de previdência social. Medidas sancionatórias. Certificado de Regularidade Previdenciária - CRP. Competência legislativa concorrente da União. Art. 24, XII e § 1º, da Constituição Federal. Provimento. I. Caso em exame 1. Trata-se de recurso extraordinário, com repercussão geral (Tema nº 968), contra decisão pela qual se afasta a exigência do Certificado de Regularidade Previdenciária - CRP, determinando-se à União que se abstenha de aplicar sanção pelo descumprimento das normas gerais de organização e funcionamento dos regimes próprios de previdência social. II. Questão jurídica em discussão 2. Saber se a previsão de sanções pelo descumprimento dos critérios e exigências aplicáveis aos regimes próprios de previdência social extrapola os limites da competência da União para estabelecer normas gerais nessa matéria. III. Razões de decidir 3. A União tem competência constitucional para editar normas gerais em matéria previdenciária (art. 24, XII, § 1º), bem como para fiscalizar os regimes próprios de previdência social (art. 40, § 22, III). 4. Em matéria de previdência social dos servidores públicos, o texto constitucional investe a União no relevante papel de fiscalização, incumbência que se mostra inviável de ser realizada a contento sem que lhe sejam assegurados instrumentos legais e efetivos de controle. 5. Normas gerais editadas pelo ente central que consubstanciam meios alinhados ao dever constitucional de responsabilidade fiscal, sem a qual não existe responsabilidade social, inclusive na dimensão intergeracional. IV. Dispositivo e Tese 6. Recurso extraordinário provido. Tese de julgamento: “1. É constitucional a previsão, em lei federal, de medidas sancionatórias ao ente federativo que descumprir os critérios e exigências aplicáveis aos regimes próprios de previdência social. 2. Admite-se o controle judicial das exigências feitas pela União no exercício da fiscalização desses regimes. Nesse caso, o ente fiscalizado deverá demonstrar, de forma técnica: (i) a inexistência do déficit atuarial apontado; ou, (ii) caso reconheça o desequilíbrio, a impertinência das medidas impostas pela União e a existência de plano alternativo capaz de assegurar, de maneira equivalente, a sustentabilidade do regime”. __________ Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal, arts. 24, XII, § 1º, 40, caput e § 22, III, 164-A e 167-A. Jurisprudência relevante citada: RE 395666 AgR, rel. Min. Eros Grau, j. 25.10.2005; RE 495684 AgR, rel. Min. Ellen Gracie, j. 15.03.2011.

(RE 1007271, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: FLÁVIO DINO, Tribunal Pleno, julgado em 16-12-2024, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n  DIVULG 12-02-2025  PUBLIC 13-02-2025) Grifo nosso.


Questão da FGV

A Lei Complementar Federal nº X veiculou normas gerais de organização, de funcionamento e de responsabilidade na gestão dos regimes próprios de previdência social preexistentes à sua edição, tendo ainda cominado sanção para o ente subnacional que não as observasse, consistente na vedação de figurar como beneficiário de transferências voluntárias de origem federal. Além disso, vedou a instituição de regime dessa natureza. 

À luz da sistemática constitucional, é correto afirmar, na perspectiva da competência da União, que a Lei Complementar Federal nº X é: 

(A) inconstitucional, por imiscuir-se em matéria afeta a cada ente subnacional no exercício de sua autonomia política; 

(B) apenas parcialmente inconstitucional, ao cominar sanções para a inobservância das normas gerais que veicula, o que afronta o pacto federativo; 

(C) apenas parcialmente inconstitucional, ao vedar que o ente subnacional venha a instituir o regime próprio, em afronta à sua autonomia política; 

(D) constitucional, pois a criação de regimes próprios decorre de permissivo contido em lei complementar da União, sendo-lhe permitido estabelecer regras e cominar sanções, ou mesmo vedar a sua instituição; 

(E) constitucional, pois a União tem competência legislativa para a edição das normas gerais e para fiscalizar os regimes próprios, além de a vedação à instituição de novos regimes dessa natureza decorrer da própria ordem constitucional.

Gabarito: E

É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STF no Tema nº 1.184 da Repercussão Geral 

1. É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado. 

2. O ajuizamento da execução fiscal dependerá da prévia adoção das seguintes providências: 

a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e 

b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida. 

3. O trâmite de ações de execução fiscal não impede os entes federados de pedirem a suspensão do processo para a adoção das medidas previstas no item 2, devendo, nesse caso, o juiz ser comunicado do prazo para as providências cabíveis.


Ementa

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. EXTINÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL DE BAIXO VALOR POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR: POSTERIOR AO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 591.033 (TEMA N. 109). INEXISTÊNCIA DE DESOBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS FEDERATIVO E DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. FUNDAMENTOS EXPOSTOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA TESE DO TEMA N. 109 DA REPERCUSSÃO GERAL: INAPLICABILIDADE PELA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA QUE POSSIBILITOU PROTESTO DAS CERTIDÕES DA DÍVIDA ATIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO . 1. Ao se extinguir a execução fiscal de pequeno valor com base em legislação de ente federado diverso do exequente, mas com fundamento em súmula do Tribunal catarinense e do Conselho da Magistratura de Santa Catarina e na alteração legislativa que possibilitou protesto de certidões da dívida ativa, respeitou-se o princípio da eficiência administrativa. 2. Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem nortear as práticas administrativas e financeiras na busca do atendimento do interesse público. Gastos de recursos públicos vultosos para obtenção de cobranças de pequeno valor são desproporcionais e sem razão jurídica válida. 3. O acolhimento de outros meios de satisfação de créditos do ente público é previsto na legislação vigente, podendo a pessoa federada valer-se de meios administrativos para obter a satisfação do que lhe é devido. 4. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento com proposta da seguinte tese com repercussão geral: “É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor, pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio da eficiência administrativa”.

(RE 1355208, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 19-12-2023, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n  DIVULG 01-04-2024  PUBLIC 02-04-2024) Grifo nosso.


Julgado correlato

TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. MUNICÍPIO. VALOR DIMINUTO. INTERESSE DE AGIR. SENTENÇA DE EXTINÇÃO ANULADA. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO AOS DEMAIS RECURSOS FUNDADOS EM IDÊNTICA CONTROVÉRSIA. 1. O Município é ente federado detentor de autonomia tributária, com competência legislativa plena tanto para a instituição do tributo, observado o art. 150, I, da Constituição, como para eventuais desonerações, nos termos do art. 150, § 6º, da Constituição. 2. As normas comuns a todas as esferas restringem-se aos princípios constitucionais tributários, às limitações ao poder de tributar e às normas gerais de direito tributário estabelecidas por lei complementar. 3. A Lei nº 4.468/84 do Estado de São Paulo - que autoriza a não-inscrição em dívida ativa e o não-ajuizamento de débitos de pequeno valor - não pode ser aplicada a Município, não servindo de fundamento para a extinção das execuções fiscais que promova, sob pena de violação à sua competência tributária. 4. Não é dado aos entes políticos valerem-se de sanções políticas contra os contribuintes inadimplentes, cabendo-lhes, isto sim, proceder ao lançamento, inscrição e cobrança judicial de seus créditos, de modo que o interesse processual para o ajuizamento de execução está presente. 5. Negar ao Município a possibilidade de executar seus créditos de pequeno valor sob o fundamento da falta de interesse econômico viola o direito de acesso à justiça. 6. Sentença de extinção anulada. 7. Orientação a ser aplicada aos recursos idênticos, conforme o disposto no art. 543-B, § 3º, do CPC.

(RE 591033, Relator(a): ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 17-11-2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-038 DIVULG 24-02-2011 PUBLIC 25-02-2011 EMENT VOL-02471-01 PP-00175 RTJ VOL-00228-01 PP-00652)


Questão da FGV

O Estado Alfa, com base em uma análise econômica do direito, editou a Lei Estadual nº Z, dispondo que os débitos tributários inscritos em dívida ativa estadual ou municipal, de valor inferior a X (valor correspondente a menos de 30% do salário mínimo nacional), não deveriam ser cobrados com o ajuizamento de execução fiscal, mas, sim, por meios administrativos, incluindo o possível protesto. Em sede de embargos à execução, um devedor do imposto sobre a propriedade territorial e predial urbana invocou o disposto na Lei Estadual nº Z, requerendo a extinção da execução fiscal ajuizada pelo Município Beta em razão da falta de interesse de agir. Já o Município Beta sustentou que a Lei Estadual nº Z seria inconstitucional. 

O magistrado competente, ao analisar a causa, observou corretamente que a Lei Estadual nº Z é: 

(A) constitucional, caso a União, por meio de lei complementar, tenha autorizado a sua edição; 

(B) constitucional, pois os estados possuem competência para legislar sobre procedimentos; 

(C) inconstitucional, pois os estados não possuem competência para legislar sobre direito financeiro; 

(D) inconstitucional, pois afronta a competência do Município Beta para instituir o tributo e eventuais desonerações; 

(E) constitucional, pois os estados possuem competência para suplementar a legislação federal em matéria de direito financeiro.

Gabarito: D

É inconstitucional a prática de desqualificar a mulher vítima de violência durante a instrução e o julgamento de crimes contra a dignidade sexual e todos os crimes de violência contra a mulher, de maneira que se proíbe eventual menção, inquirição ou fundamentação sobre a vida sexual pregressa ou o modo de vida da vítima em audiências e decisões judiciais

Jurisprudência cobrada na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STF

É inconstitucional a prática de desqualificar a mulher vítima de violência durante a instrução e o julgamento de crimes contra a dignidade sexual e todos os crimes de violência contra a mulher, de maneira que se proíbe eventual menção, inquirição ou fundamentação sobre a vida sexual pregressa ou o modo de vida da vítima em audiências e decisões judiciais.


Ementa

EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ALEGADA CONDUTA OMISSIVA E COMISSIVA DO PODER PÚBLICO NO COMBATE À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. PROCESSOS DE APURAÇÃO E JULGAMENTO DE CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. QUESTIONAMENTOS QUANTO AO MODO DE VIDA E À VIVÊNCIA SEXUAL PREGRESSA DA VÍTIMA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ARGUIÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. Ofende os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana a perquirição da vítima, em processos apuratórios e julgamentos de crimes contra a dignidade sexual, quanto ao seu modo de vida e histórico de experiências sexuais. 2. A despeito da atuação dos Poderes da República, pela análise dos argumentos postos na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental, é de se concluir necessário que este Supremo Tribunal, no exercício de sua competência constitucional, interprete os dispositivos impugnados pelo arguente conforme a Constituição da República, para conferir máxima efetividade aos direitos constitucionalmente postos e coibir a perpetuação de práticas que impliquem na revitimização de mulheres agredidas sexualmente. 3. Arguição julgada procedente para i) conferir interpretação conforme à Constituição à expressão “elementos alheios aos fatos objeto de apuração” posta no art. 400-A do Código de Processo Penal, para excluir a possibilidade de invocação, pelas partes ou procuradores, de elementos referentes à vivência sexual pregressa da vítima ou ao seu modo de vida em audiência de instrução e julgamento de crimes contra a dignidade sexual e de violência contra a mulher, sob pena de nulidade do ato ou do julgamento, nos termos dos arts. 563 a 573 do Código de Processo Penal; ii) fica vedado o reconhecimento da nulidade referida no item anterior na hipótese de a defesa invocar o modo de vida da vítima ou a questionar quanto a vivência sexual pregressa com essa finalidade, considerando a impossibilidade do acusado se beneficiar da própria torpeza; iii) conferir interpretação conforme ao art. 59 do Código Penal, para assentar ser vedado ao magistrado, na fixação da pena em crimes sexuais, valorar a vida sexual pregressa da vítima ou seu modo de vida e iv) assentar ser dever do magistrado julgador atuar no sentido de impedir essa prática inconstitucional, sob pena de responsabilização civil, administrativa e penal.

(ADPF 1107, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 23-05-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 23-08-2024  PUBLIC 26-08-2024) Grifo nosso.


Questão da FGV

Sobre os crimes contra a dignidade sexual, é correto afirmar que: 

(A) nos crimes sexuais cometidos contra vítima em situação de vulnerabilidade temporária, a ação penal é pública incondicionada, ainda que o fato tenha sido praticado na vigência da redação dada ao Art. 225 do CP pela Lei nº 12.015/2009; 

(B) com base no princípio da ampla defesa, é facultado à defesa técnica invocar, em audiências, elementos sobre a vida sexual pregressa ou modo de vida da vítima; 

(C) o delito de assédio sexual previsto pelo Código Penal não se configura na hipótese de constrangimento, com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, praticado por um estagiário contra a coordenadora da seção em que trabalha; 

(D) configura contravenção penal o ato de produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes; 

(E) o crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos, podendo ser afastada a imputação do resultado na hipótese de comprovação de consentimento da vítima, de sua experiência sexual anterior ou da existência de relacionamento amoroso com o agente. 

Gabarito: C

A embriaguez e o excesso de velocidade, por si sós, não demonstram o dolo eventual, sendo necessário a presença de outros elementos concretos aptos a indicar a assunção do risco

Jurisprudência cobrada na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ

A embriaguez e o excesso de velocidade, por si sós, não demonstram o dolo eventual, sendo necessário a presença de outros elementos concretos aptos a indicar a assunção do risco.

 

Ementa dos julgados

DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. PRONÚNCIA. DOLO EVENTUAL. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

I. Caso em exame 

1. Agravo regimental interposto pelo Ministério Público contra decisão monocrática que não conheceu do recurso especial, alegando a necessidade de pronúncia do acusado por suposto dolo em sua conduta.

II. Questão em discussão 

2. A questão em discussão consiste em saber se há provas suficientes para a pronúncia do acusado com base no dolo eventual em crime de homicídio na direção de veículo automotor, e se a decisão monocrática que aplicou a Súmula 7/STJ deve ser mantida.

3. A questão também envolve a análise da alegada violação do art. 619 do CPP, considerando a deficiência na fundamentação do recurso especial.

III. Razões de decidir 

4. A decisão monocrática foi mantida, pois a parte agravante não indicou de forma específica e pormenorizada os pontos sobre os quais o Tribunal local deveria ter se manifestado, configurando deficiência na fundamentação recursal e atraindo a incidência da Súmula 284/STF.

5. As instâncias ordinárias concluíram de maneira unânime e motivada que não ficou suficientemente demonstrado o elemento subjetivo doloso na conduta do acusado, não havendo elementos suficientes para a caracterização do dolo eventual.

6. A jurisprudência do STJ estabelece que a embriaguez e o excesso de velocidade, por si sós, não demonstram o dolo eventual, sendo necessário a presença de outros elementos concretos aptos a indicar a assunção do risco.

IV. Dispositivo e tese 

7. Agravo regimental improvido.

Tese de julgamento: "1. A embriaguez e o excesso de velocidade, isoladamente, não configuram dolo eventual em crimes de trânsito. 2. A aplicação da Súmula 7/STJ é adequada quando a revisão do julgado demandar reexame de provas.".

Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 619.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no REsp 1.991.574/SP, Rel. Min. João Batista Moreira, Quinta Turma, julgado em 03.10.2023; STJ, AgRg no AREsp 2.519.852/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 03.09.2024; STJ, AgRg no REsp 1.873.528/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 28.11.2022.

(AgRg no REsp n. 2.194.943/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 19/5/2025.) Grifo nosso.

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. DESCLASSIFICAÇÃO DE HOMICÍDIO DOLOSO PARA CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EXCEPCIONAL HIPÓTESE DE VIABILIDADE DA DESCLASSIFICAÇÃO NA FASE DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. QUESTÃO QUE IMPACTA NA FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DISCUSSÃO FÁTICA. PARÂMETROS FIXADOS NA INICIAL ACUSATÓRIA. EMBRIAGUEZ COMO ÚNICO ELEMENTO A JUSTIFICAR A IMPUTAÇÃO POR DOLO EVENTUAL. CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE PARA TAL DELINEAMENTO. PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS. RECURSO EM HABEAS CORPUS PROVIDO.

I. Caso em exame 

1. Recurso ordinário em habeas corpus interposto contra o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que denegou a ordem pleiteada para desclassificar a imputação de homicídio doloso qualificado para homicídio culposo na direção de veículo automotor, com base na alegação de que a embriaguez ao volante, por si só, não caracteriza dolo eventual.

2. O recorrente foi denunciado por homicídio doloso qualificado em razão de acidente de trânsito, com sinais de embriaguez, e a Defesa pleiteou, em resposta à Acusação, a desclassificação para a modalidade culposa e o afastamento das qualificadoras. As instâncias de origem reputaram prematuro o enfrentamento da questão, que, em seu entender, deveria ocorrer quando ultimada a instrução.

II. Questão em discussão 

3. A discussão consiste em saber se a embriaguez ao volante, isoladamente, é suficiente para caracterizar o dolo eventual em acidente de trânsito com resultado morte. Subsidiariamente, também envolve a compatibilidade entre o dolo eventual e as qualificadoras imputadas, como perigo comum e recurso que dificultou a defesa da vítima.

4. De forma preliminar, é colocada sob escrutínio a viabilidade ou não da análise em apreço na via eleita e no momento processual (análise da resposta à acusação) em que se deram.

III. Razões de decidir 

5. A embriaguez, isoladamente, não é suficiente para caracterizar o dolo eventual, conforme jurisprudência do STJ, que exige circunstâncias adicionais para tal caracterização.

6. A análise do pleito de desclassificação é cabível na fase de recebimento da denúncia de maneira excepcional, quando a discussão não depende da avaliação do contexto fático e pode impactar na competência para a tramitação do feito originário - o que ocorre na espécie.

IV. Dispositivo e tese 

7. Recurso provido para desclassificar a imputação para o delito do art. 302, §3º, do CTB e determinar a remessa dos autos ao juízo competente.

Tese de julgamento: 1. A embriaguez, isoladamente, não caracteriza dolo eventual em acidente de trânsito com resultado morte. 2. A desclassificação para homicídio culposo é cabível na fase de análise da resposta à acusação quando a discussão não envolve questionamento fático e impacta na competência para o processamento do feito.

Dispositivos relevantes citados: CTB, art. 302, §3º; CPP, art. 384.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.689.173/SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 21.11.2017; STJ, AgRg no AREsp 2.519.852/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 03.09.2024.

(RHC n. 208.285/SP, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 20/3/2025, DJEN de 26/3/2025.) Grifo nosso.

 

Questão da FGV

Analise as hipóteses a seguir. 

 (i) Mariana vai à festa de aniversário de uma amiga, ingere bebida alcoólica e, ao retornar para casa, na condução de seu veículo, abalroa a traseira do carro de Fernanda, que sofre ferimentos graves, mas sobrevive. 

(ii) João decide matar Mário, seu opositor político, e planeja provocar um acidente de carro, aproveitando-se de que a vítima e seu motorista Fábio rotineiramente trafegam por uma estrada à beira de um penhasco. Certo dia, João executa o plano e o acidente provocado causa a morte de Mário e Fábio. 

(iii) Patrício decide matar Renata, sua ex-esposa, por conta de desavenças relativas à pensão alimentícia. Para assegurar o êxito da missão, acopla um kit rajadas a sua pistola. No dia escolhido para o crime, Patrício, em uma motocicleta, segue o veículo de Renata e vê quando Mara, colega de trabalho da vítima, entra no carro. Patrício emparelha com o carro, mira na cabeça de Renata e dispara. Mara também é atingida e ambas morrem. 

Consideradas as hipóteses acima, a respeito do dolo, é correto afirmar, à luz da doutrina e da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que: 

(A) há dolo indireto na hipótese (i) e nas mortes de Fábio e de Mara; 

(B) na hipótese (i), a embriaguez não é suficiente para justificar a imputação de tentativa de homicídio com dolo eventual; 

(C) na hipótese (i), não se admite o dolo eventual, haja vista a incompatibilidade entre este e a tentativa; 

(D) há dolo direto nas mortes de Fábio e de Mara; 

(E) há dolo de segundo grau na morte de Mara. 

Gabarito: B


É possível, em tese, a condenação da emissora de televisão ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, quando, ao exibir determinada programação fora do horário recomendado, verificar-se uma conduta que afronte gravemente os valores e interesse coletivos fundamentais

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.


Tese fixada pelo STJ

É possível, em tese, a condenação da emissora de televisão ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, quando, ao exibir determinada programação fora do horário recomendado, verificar-se uma conduta que afronte gravemente os valores e interesse coletivos fundamentais.


Ementa

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LIBERDADE DE COMUNICAÇÃO E PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMISSORA DE TELEVISÃO. EXIBIÇÃO DE FILME EM HORÁRIO DIVERSO DAQUELE RECOMENDADO PELA CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA. AUSÊNCIA DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA (ADI N. 2.404/DF). DANOS MORAIS COLETIVOS POR ABUSO DE DIREITO. POSSIBILIDADE, EM TESE. HIPÓTESE NÃO VERIFICADA NO CASO DOS AUTOS. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

1. O propósito recursal cinge-se em saber se é possível a condenação de emissora de televisão ao pagamento de indenização por danos morais coletivos em razão da exibição de filme fora do horário recomendado pelo órgão competente.

2. No julgamento da ADI n. 2.404/DF, o STF reconheceu a inconstitucionalidade da expressão "em horário diverso do autorizado", contida no art. 254 do ECA, asseverando, ainda, que a classificação indicativa não pode ser vista como obrigatória ou como uma censura prévia dos conteúdos veiculados em rádio e televisão, haja vista seu caráter pedagógico e complementar ao auxiliar os pais a definir o que seus filhos podem, ou não, assistir e ouvir.

3. A despeito de ser a classificação da programação apenas indicativa e não proibir a sua veiculação em horários diversos daqueles recomendados, cabe ao Poder Judiciário controlar eventuais abusos e violações ao direito à programação sadia.

4. O dano moral coletivo se dá in re ipsa, contudo, sua configuração somente ocorrerá quando a conduta antijurídica afetar, intoleravelmente, os valores e interesses coletivos fundamentais, mediante conduta maculada de grave lesão, para que o instituto não seja tratado de forma trivial, notadamente em decorrência da sua repercussão social.

5. É possível, em tese, a condenação da emissora de televisão ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, quando, ao exibir determinada programação fora do horário recomendado, verificar-se uma conduta que afronte gravemente os valores e interesse coletivos fundamentais.

6. A conduta perpetrada pela ré no caso vertente, a despeito de ser irregular, não foi capaz de abalar, de forma intolerável, a tranquilidade social dos telespectadores, de modo que não está configurado o ato ilícito indenizável.

7. Recurso especial desprovido.

(REsp n. 1.840.463/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 19/11/2019, DJe de 3/12/2019.) Grifo nosso.


Questão da FGV

O Ministério Público promoveu ação civil pública em desfavor da Rede de Televisão Binacional S/A, sob a alegação de que a requerida, por meio de sua programação televisiva, exibiu obra audiovisual em horário inadequado à respectiva classificação indicativa, em desacordo com ato normativo emitido pelo Ministério da Justiça. Em razão disso, pleiteia-se a condenação da emissora ao pagamento de indenização por danos morais coletivos. 

Considerando-se o caso proposto, as disposições da Lei nº 8.069/1990 e o entendimento dos Tribunais Superiores, é correto afirmar que: 

(A) com base no princípio da proteção integral e no dever geral de observância aos direitos infantojuvenis, admite-se o controle prévio de viés autorizativo do Estado sobre o conteúdo a ser exibido pelas emissoras de rádio e televisão; 

(B) a conduta da emissora de transmitir, através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificação se traduz em infração administrativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo admitidas penas de multa e suspensão da sua programação por até dois dias, em caso de reincidência; 

(C) a conduta da emissora de transmitir, através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificação se traduz em infração administrativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, não sendo admitida a suspensão da sua programação por importar em violação à liberdade de expressão; 

(D) comprovada a grave afronta aos valores e interesses coletivos fundamentais, é possível a condenação da emissora de televisão ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, sem que isso configure violação à liberdade de expressão em sua dimensão instrumental; 

(E) é cabível a condenação da emissora, pois, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, nenhum espetáculo será apresentado ou anunciado sem aviso de sua classificação, antes de sua transmissão, apresentação ou exibição, ressalvados os programas com finalidades meramente educativas.

Gabarito: D

Os Juizados Especiais da Fazenda Pública possuem competência absoluta para julgar as demandas quando o valor da causa não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos

Jurisprudência cobrada na prova do TJ/AM (prova discursiva) para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.


Tese fixada pelo STJ

Os Juizados Especiais da Fazenda Pública possuem competência absoluta para julgar as demandas quando o valor da causa não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos, sendo certo que a complexidade da causa não é motivo suficiente para afastar a competência dos juizados especiais.


Ementa

PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO RECORRIDO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. FUNDAMENTO AUTÔNOMO. IMPUGNAÇÃO E VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. COMPETÊNCIA ABSOLUTA.

1.Inexiste ofensa ao art. 489, § 1º, do CPC quando o Tribunal de origem se manifesta de modo fundamentado acerca das questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, porquanto julgamento desfavorável ao interesse da parte não se confunde com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.

2. Ausência de impugnação a fundamento autônomo do acórdão recorrido, suficiente para mantê-lo. Incidência das Súmulas 283 e 284 do STF.

3. Esta Corte Superior possui o entendimento de que "...na declaração de incompetência absoluta, a fundamentação amparada em lei não constitui inovação no litígio, porque é de rigor o exame da competência em função da matéria ou hierarquia antes da análise efetiva das questões controvertidas apresentadas ao juiz. Assim, tem-se que, nos termos do Enunciado n. 4 da ENFAM, 'Na declaração de incompetência absoluta não se aplica o disposto no art. 10, parte final, do CPC/2015." ((AgInt no RMS n. 61.732/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 5/12/2019, DJe de 12/12/2019.) Precedentes.

4. O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que os Juizados Especiais possuem competência absoluta para julgar as demandas quando o valor da causa não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos, sendo certo que a complexidade da causa não é motivo suficiente para afastar a competência dos juizados especiais. Precedentes.

5. Agravo interno desprovido.

(AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.201.340/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 4/9/2023, DJe de 6/9/2023.) Grifo nosso.


Julgado no mesmo sentido

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. RECURSO PROVIDO.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é absoluta, conforme o art. 2º, § 4º, da Lei 12.153/2009, sendo determinada pelo valor da causa e que, a complexidade da causa não é motivo suficiente para afastar a competência dos Juizados Especiais, desde que o valor não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos.

2. Recurso provido para declarar a incompetência da Justiça Comum e determinar a remessa dos autos para a vara dos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

(REsp n. 2.137.035/RN, relator Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 3/6/2025, DJEN de 9/6/2025.) Grifo nosso.


Questão da FGV

O condomínio Apartamentos Grandes ajuizou ação de cobrança em face do estado do Amazonas, que figura como proprietário de uma das unidades autônomas, com o intuito de receber o valor equivalente a R$ 35.000,00, referente a cotas condominiais inadimplidas. A petição inicial foi instruída com diversos documentos, dentre eles, os boletos mensais de cobrança, enviados a e-mail institucional administrado pela Secretaria de Estado de Planejamento. 

O juízo da Primeira Vara de Fazenda Pública da Comarca de Manaus, ao efetuar o juízo de admissibilidade da petição inicial, entendeu que o autor deveria ter ajuizado ação de execução fundada em título extrajudicial, em razão de o crédito estar documentado. Além disso, pelo fato de o valor atribuído à causa ser inferior a 60 salários mínimos, o magistrado considerou que o processo deveria tramitar perante o Juizado Especial de Fazenda Pública, em razão da competência determinada em lei ao Juizado. 

Fundado em tais razões, o juízo proferiu decisão na qual determinou (i) a emenda da petição inicial, adaptando-a ao procedimento da execução de título extrajudicial; e, (ii) após, a remessa dos autos ao Juizado Especial de Fazenda Pública. 

Considerando o caso acima narrado, responda fundamentadamente: 

a) A emenda à inicial, no que se refere à adaptação da peça exordial ao procedimento executivo, foi acertada? 

b) O Juizado Especial de Fazenda Pública é competente para apreciar a causa?


Espelho de resposta

A multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de astreinte

Julgado cobrado na prova do TJ/AM (prova discursiva) para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ

A multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de astreinte. 

 

Ementa 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSAÇÃO HOMOLOGADA JUDICIALMENTE. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 632 E 633 DO CPC/1973. RECONHECIMENTO DA PRECLUSÃO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF. MULTA CONVENCIONADA PELAS PARTES EM TRANSAÇÃO JUDICIAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ASTREINTE. NATUREZA JURÍDICA DE CLÁUSULA PENAL. REDUÇÃO A QUALQUER TEMPO. DEVER DO JUIZ. ART. 413 DO CC/2002. NORMA COGENTE E DE ORDEM PÚBLICA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA E JURÍDICA. AUSÊNCIA.

1. Ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de compensação por danos morais, ajuizada em 7/1/2010, na qual houve homologação judicial de transação formulada entre as partes, atualmente em fase de cumprimento de sentença, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 7/6/2021 e concluso ao gabinete em 24/3/2022.

2. O propósito recursal é decidir (I) qual é a natureza jurídica da multa convencionada pelas partes em transação homologada judicialmente; e (II) se é possível reduzir o seu valor a qualquer tempo.

3. A astreinte não deriva de convenção entre as partes, mas sim de imposição pelo Juízo, independentemente da vontade daquelas, a fim de assegurar o cumprimento de uma determinada ordem judicial.

4. A transação, mesmo quando homologada judicialmente, é um contrato típico (arts. 840 e 842 do CC/2002) e a fixação de multa em contratos é expressamente regulamentada pelo Código Civil, que prevê a possibilidade de se estipular cláusula penal conjuntamente com a obrigação ou em ato posterior, referindo-se à inexecução completa desta, à alguma cláusula especial ou à mora (art. 409).

5. A multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal) e não de astreinte, porquanto esta tem caráter processual e decorre de imposição pelo Judiciário e aquela configura instituto de direito material e tem origem na vontade das partes.

6. Nas hipóteses do art. 413 do CC/2002, o abrandamento do valor da cláusula penal é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever do juiz e direito do devedor que lhe sejam aplicados os princípios da boa-fé contratual e da função social do contrato.

Precedentes.

7. Assim, a despeito da formação de coisa julgada pela decisão que homologa a transação entabulada entre as partes, a cláusula penal nela prevista deve ser reduzida pelo juiz, mediante o princípio da equidade, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida ou se o valor for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio, por força do art. 413 do CC/2002, bem como em observância à origem eminentemente contratual da transação.

8. A conclusão de que a multa é manifestamente excessiva não decorre do simples fato de seu valor ser elevado, mas do cotejo entre o seu montante e as circunstâncias da hipótese concreta, de modo que a análise de eventual desproporcionalidade na cláusula penal fixada entre as partes tem caráter excepcional em sede de recurso especial, diante da incidência das Súmulas 5 e7 do STJ.

9. Hipótese em que (I) a recorrente sustenta a possibilidade de redução da multa exclusivamente sob o fundamento de que se trata de astreinte, incidindo, segundo alega, o art. 537, § 1º, do CPC/2015;

(II) todavia, a multa foi pactuada pelas partes em transação homologada judicialmente, de modo que tem natureza jurídica de cláusula penal e não de astreinte, sendo suas hipóteses de redução aquelas previstas no CC/2002; (III) ademais, no particular, o mero fato de a multa ter ultrapassado R$ 85.000,00 não demonstra a sua excessividade, sobretudo considerando que o descumprimento da obrigação foi reconhecido por decisão transitada em julgado.

10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.

(REsp n. 1.999.836/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022.) Grifo nosso.

 

Questão da FGV

O Banco Anatos, promitente comprador de um imóvel incorporado por XXX Construtora Ltda., acionou a vendedora reclamando do atraso na entrega da unidade que havia adquirido para construção de sua sede. Antes da sentença, as partes compuseram acordo judicial, que foi homologado pela Primeira Vara de Manaus, prevendo a entrega das chaves em 30 dias, sob pena de multa diária de 1% do valor pago pelo imóvel.

Passado o trintídio, como a construtora não cumpria a obrigação, a instituição financeira passou a executar o acordo, constituindo a ré em mora. 

Depois de 150 dias de inércia, o juízo penhora o valor acumulado da multa diária nas contas da devedora, o que a faz vir aos autos, tempestiva e adequadamente, requerer a redução sob os seguintes fundamentos: (i) já supera o valor do próprio imóvel; e, (ii) embora não negue a inadimplência, ela seria parcial, na medida em que 75% de todas as providências necessárias para a entrega da unidade já teriam sido tomadas. 

Analise o pleito, de maneira justificada, em relação a ambos os argumentos do réu. Ao final, indique sua conclusão, também apresentando e detalhando os conceitos jurídicos envolvidos. Desnecessária a forma de sentença. Considere provados todos os fatos. 

1. A resposta deve ser fundamentada, de modo que a mera referência a entendimento jurisprudencial ou doutrinário, sem justificativa específica, não pontuará. 

2. A mera citação de artigo legal, ou de resposta “sim” ou “não”, desacompanhada da devida justificativa, não garante a pontuação na questão.


A Lei Maria da Penha prevalece quando suas disposições conflitarem com as de estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ no Tema Repetitivo nº 1.186 do STJ

1. A condição de gênero feminino é suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de violência doméstica e familiar, prevalecendo sobre a questão etária.

2. A Lei Maria da Penha prevalece quando suas disposições conflitarem com as de estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente.

 

Ementa

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. VÍTIMA MULHER. LEI MARIA DA PENHA. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. RECURSO DESPROVIDO.

I. Caso em exame

1. Recurso representativo de controvérsia.

Atendimento ao disposto no art. 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil e da Resolução 8/2008 do STJ.

2. Recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado do Pará contra acórdão do Tribunal de Justiça do Pará, que declarou a competência da Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Santarém/PA para julgar crimes de estupro de vulnerável cometidos contra três filhas menores do investigado.

3. O Tribunal de Justiça do Pará entendeu que a violência sexual praticada no âmbito doméstico e familiar contra as vítimas do sexo feminino atrai a aplicação da Lei Maria da Penha, prevalecendo sobre a questão etária.

II. Questão em discussão

4. Delimitação da controvérsia: a idade da vítima, por si só, não é elemento apto a afastar a competência da vara especializada para processar os crimes perpetrados contra vítima mulher, seja criança ou adolescente, no contexto de violência doméstica e familiar.

5. Tese: o gênero feminino, independentemente de ser a vítima criança ou adolescente, é condição única e suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei n. 11.430/2006 (Lei Maria da Penha) nos casos de violência doméstica e familiar praticada contra a mulher.

6. A questão em discussão consiste em saber se a condição de gênero feminino, independentemente de ser a vítima criança ou adolescente, é suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei Maria da Penha nos casos de violência doméstica e familiar, afastando a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente.

III. Razões de decidir

7. A interpretação literal do art. 13 da Lei Maria da Penha indica a prevalência de suas disposições quando em conflito com estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente.

8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça considera que a vulnerabilidade da mulher é preponderante sobre a vulnerabilidade etária, sendo desnecessária a demonstração específica da subjugação feminina para a aplicação da Lei Maria da Penha.

9. A violência de gênero é configurada pela condição de mulher da vítima, independentemente de sua idade, quando a violência ocorre no âmbito doméstico ou familiar.

IV. Dispositivo e tese

10. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: "1. A condição de gênero feminino é suficiente para atrair a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em casos de violência doméstica e familiar, prevalecendo sobre a questão etária.

2. A Lei Maria da Penha prevalece quando suas disposições conflitarem com as de estatutos específicos, como o da Criança e do Adolescente."

Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.340/2006, arts. 5º, 7º, 13 e 14; CP, art. 217-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, RHC 121.813/RJ, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 20/10/2020; EAREsp 2.099.532/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 26/10/2022.

(REsp n. 2.015.598/PA, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, julgado em 6/2/2025, DJEN de 13/2/2025.) Grifo nosso.

 

Julgado correlato

Após o advento do art. 23 da Lei n. 13.431/2017, nas comarcas em que não houver vara especializada em crimes contra a criança e o adolescente, compete à vara especializada em violência doméstica, onde houver, processar e julgar os casos envolvendo estupro de vulnerável cometido pelo pai (bem como pelo padrasto, companheiro, namorado ou similar) contra a filha (ou criança ou adolescente) no ambiente doméstico ou familiar.

Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 26/10/2022. Informativo nº 755 do STJ.

 

Resumo:

O crime de estupro de vulnerável praticado no contexto da violência doméstica e familiar deve ser julgado:

1) Pela vara especializada em crimes contra a criança e adolescente;

2) Caso não exista vara especializada em crimes contra a criança e adolescente na Comarca, a competência é da vara especializada em violência doméstica;

3) Quando não houver vara especializada em crimes contra a criança e adolescente e vara especializada em violência doméstica, a competência é da vara criminal comum.

 

Questão da FGV

O Ministério Público, no corrente ano de 2025, propôs ação penal em face de Mévio, imputando-lhe a prática de estupro de vulnerável cometido contra a sua enteada. De acordo com a peça acusatória, Mévio, nos momentos em que sua companheira saía de casa, aproveitava-se para praticar abusos sexuais em desfavor da infante, que, à época dos fatos, tinha 7 anos de idade. A referida ação penal tramitou em uma vara criminal comum, ante a inexistência, na localidade, de Vara Especializada da Criança e do Adolescente vítima, prevista na Lei nº 13.431/2017. A vítima foi ouvida em juízo, nos termos da legislação aplicável, e o seu relato foi corroborado por outros elementos probatórios produzidos em contraditório judicial. Ao final, julgou-se procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar Mévio. 

Tendo em vista o caso proposto, as disposições da Lei nº 13.431/2017 e a jurisprudência dos Tribunais Superiores acerca da temática, é correto afirmar que: 

(A) a oitiva da criança não poderia seguir o rito cautelar de antecipação de prova, em razão da natureza da infração imputada ao réu; 

(B) a escuta especializada, indicada no caso, é o procedimento de oitiva de criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência perante autoridade policial ou judiciária; 

(C) a competência para julgamento da ação, no caso, caberia à vara especializada em violência doméstica; apenas na ausência dessa, a competência seria da vara criminal comum; 

(D) os Tribunais de Justiça não têm prerrogativa para atribuir aos Juizados da Infância e Juventude competência para julgar crimes contra crianças e adolescentes; 

(E) o oferecimento da denúncia perante a vara criminal comum foi correto e adequado, observado o fator etário e ante a inexistência de juizado ou vara especializada em crimes contra crianças e adolescentes.

Gabarito: C

O abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, devendo ser decretado de ofício pelo juiz

Jurisprudência cobrada na primeira fase do TJ/TO para o cargo de Juiz Substituto e na fase discursiva do TJ/AM, realizadas em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ

O abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever do juiz e direito do devedor a aplicação dos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico entre as prestações, os quais convivem harmonicamente com a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda.

 

Ementa

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO DA APELAÇÃO NA ORIGEM. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RESILIÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO. ILEGALIDADE RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INCIDÊNCIA DOS ÓBICES DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. CUMPRIMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO. REDUÇÃO DA CLÁUSULA PENAL DE OFÍCIO, NOS TERMOS DO ART. 413 DO CÓDIGO CIVIL. DECISUM EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DESTA CORTE SUPERIOR. MODIFICAÇÃO DO QUANTUM FIXADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. REPARTIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA. ALTERAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. RECURSOS ESPECIAIS CONHECIDOS PARCIALMENTE E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDOS.

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, "o relator está autorizado a decidir monocraticamente recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior (arts. 557 do CPC e 34, VII, do RISTJ). Ademais, eventual nulidade da decisão singular fica superada com a apreciação do tema pelo órgão colegiado em sede de agravo interno" (AgRg no AREsp 404.467/RS, Relator o Ministro Antônio Carlos Ferreira, DJe de 5/5/2014), razão pela qual não há qualquer ilegalidade no julgamento monocrático da apelação na origem.

2. Tendo o Tribunal Paulista decidido todas as questões suficientes ao deslinde da controvérsia, não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional, tampouco em nulidade do acórdão recorrido, afastando-se, com isso, a apontada violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015.

3. Verificando que o caso se enquadra nas hipóteses previstas no art. 413 do Código Civil, não há qualquer ilegalidade na redução da cláusula penal de ofício pela Corte local, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça. Precedentes.

4. Com base na interpretação das cláusulas contratuais e na ampla análise do conjunto fático-probatório dos autos, as instâncias ordinárias concluíram que houve irregularidade na resilição unilateral do contrato efetuada pela recorrente Usina Santo Ângelo, devendo incidir, por essa razão, a respectiva multa contratual. Esse entendimento não é passível de modificação na via do recurso especial, em razão dos óbices das Súmulas 5 e 7 do STJ.

5. Na hipótese, considerando o cumprimento parcial da obrigação, correspondente a 60% do que fora contratado entre as partes, o Tribunal de Justiça de São Paulo reduziu a cláusula penal de 10% para 7% do valor total do contrato, nos termos do que dispõe o art. 413 do Código Civil. Esse decisum foi impugnado por ambas as partes, sendo pleiteado tanto o restabelecimento do valor da multa como fixado no contrato (Equipalcool), quanto uma redução ainda maior da cláusula penal (Usina Santo Ângelo).

5.1. Conforme estabelece o art. 413 do Código Civil, há basicamente duas hipóteses que permitem ao magistrado reduzir, de forma equitativa, o valor fixado na cláusula penal, quais sejam, i) se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte; ou ii) se o montante da multa for manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.

5.2. No caso, o valor da cláusula penal foi reduzido em razão do cumprimento parcial da obrigação, pois, conforme restou incontroverso nos autos, do valor total de 20 milhões de reais, foram pagos 12 milhões, correspondentes à integralidade da "primeira fase" do contrato, não se verificando, portanto, qualquer ilegalidade na respectiva redução da penalidade, tendo em vista a correta aplicação da norma disposta no art. 413 do Código Civil.

5.3. Com efeito, "no atual Código Civil, o abrandamento do valor da cláusula penal em caso de adimplemento parcial é norma cogente e de ordem pública, consistindo em dever do juiz e direito do devedor a aplicação dos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico entre as prestações, os quais convivem harmonicamente com a autonomia da vontade e o princípio pacta sunt servanda" (REsp 1.898.738/SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, DJe de 26/3/2021).

5.4. Da mesma forma, diante das particularidades do caso, também não é caso de se proceder a uma maior redução da cláusula penal, como pleiteado pela recorrente Usina Santo Ângelo, sobretudo porque, conforme ficou consignado pelas instâncias ordinárias, a recorrente Equipalcool chegou a dar início aos preparativos da "segunda fase" do contrato, constando da sentença que os equipamentos referentes à segunda fase já vinham sendo produzidos.

5.5. No particular, conforme já decidido em diversas oportunidades por esta Corte Superior, não se exige a exata correspondência matemática entre o grau de inexecução do contrato e o de redução da cláusula penal. Precedentes.

5.6. Não se pode olvidar, ainda, que o contrato subjacente, de valor milionário, foi firmado entre sociedades empresariais de grande porte, não havendo qualquer assimetria entre as empresas contratantes que justifique uma maior intervenção do Poder Judiciário na avença, além daquela efetuada pelo Tribunal de origem, em decorrência da aplicação de norma cogente (CC, art. 413).

6. Não se revela possível a reforma do acórdão recorrido, no tocante à distribuição da sucumbência, pois "esta Corte Superior de Justiça possui entendimento firmado no sentido de que rever a proporção de vitória/derrota das partes na demanda, para aferir a sucumbência recíproca ou mínima, implica em revisão de matéria fática e probatória, providência inviável de ser adotada, em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ" (AgInt no REsp 1.956.912/DF, Relator o Ministro Marco Buzzi, DJe de 6/5/2022).

7. Recursos especiais conhecidos parcialmente e, nessa extensão, desprovidos, tornando sem efeito a liminar concedida na TP 1.318/SP.

(REsp n. 1.888.028/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 24/8/2022.) Grifo nosso.

 

 Questões da FGV

 

1) A Papelaria ABC foi contratada pela sociedade de advogados XYZ para fornecer cartões de visita, pastas e papéis timbrados com a logomarca do escritório até o final do mês. Constava do contrato a previsão de vultosa multa em caso de descumprimento do avençado, não obstante a natureza e a finalidade da obrigação não justificassem esse montante. Ademais, pelo contrato, a ABC renunciava à faculdade de pleitear a redução judicial da multa. Quando o contrato foi descumprido, a XYZ ajuizou ação em face da ABC pretendendo receber a multa, e a ABC, em sua defesa, não alegou seu excesso manifesto. 

Diante disso, com relação à redução judicial da multa por excesso manifesto, o magistrado: 

(A) pode reduzir equitativamente a multa, pois a norma é cogente e pode ser aplicada de ofício pelo magistrado, contanto que instaure debate prévio com contraditório; 

(B) pode reduzir equitativamente a multa, mas somente se houver intervenção do Ministério Público no processo, como fiscal da lei; 

(C) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, embora ele pudesse conhecer de ofício a excessividade, a norma foi afastada pela vontade das partes; 

(D) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, embora a norma seja cogente, ele não pode conhecer de ofício a excessividade; 

(E) não pode reduzir equitativamente a multa, pois, além de a norma ter sido afastada pela vontade das partes, ele não pode conhecer de ofício a excessividade.

Gabarito: A

 

2) O Banco Anatos, promitente comprador de um imóvel incorporado por XXX Construtora Ltda., acionou a vendedora reclamando do atraso na entrega da unidade que havia adquirido para construção de sua sede. Antes da sentença, as partes compuseram acordo judicial, que foi homologado pela Primeira Vara de Manaus, prevendo a entrega das chaves em 30 dias, sob pena de multa diária de 1% do valor pago pelo imóvel.

Passado o trintídio, como a construtora não cumpria a obrigação, a instituição financeira passou a executar o acordo, constituindo a ré em mora. 

Depois de 150 dias de inércia, o juízo penhora o valor acumulado da multa diária nas contas da devedora, o que a faz vir aos autos, tempestiva e adequadamente, requerer a redução sob os seguintes fundamentos: (i) já supera o valor do próprio imóvel; e, (ii) embora não negue a inadimplência, ela seria parcial, na medida em que 75% de todas as providências necessárias para a entrega da unidade já teriam sido tomadas. 

Analise o pleito, de maneira justificada, em relação a ambos os argumentos do réu. Ao final, indique sua conclusão, também apresentando e detalhando os conceitos jurídicos envolvidos. Desnecessária a forma de sentença. Considere provados todos os fatos. 

1. A resposta deve ser fundamentada, de modo que a mera referência a entendimento jurisprudencial ou doutrinário, sem justificativa específica, não pontuará. 

2. A mera citação de artigo legal, ou de resposta “sim” ou “não”, desacompanhada da devida justificativa, não garante a pontuação na questão.