Julgado cobrado na prova do TRF3 para o cargo de Juiz(a) Federal Substituto(a), realizada em 2025.
Resumo (informativo 1.106 do STF)
"É constitucional o art. 3º da Lei 2019/13.964 (Lei Anticrime), especificamente
quanto à instituição e à implementação do juiz das garantias no processo penal
brasileiro, porquanto trata de questões atinentes ao processo penal, matéria da
competência legislativa privativa da União (CF/1988, art. 22, I), que tem natureza
cogente sobre todos os entes federativos e os Poderes da República. No entanto, é
formalmente inconstitucional — por configurar invasão desarrazoada à autonomia administrativa e ao poder de auto-organização do Judiciário (CF/1988, art. 96,
I) — a introdução, pela Lei Anticrime, do parágrafo único do art. 3º-D do CPP, que
impõe a criação de um “sistema de rodízio de magistrados” nas comarcas em que
funcionar um único juiz.
A implementação do juiz das garantias visa garantir uma maior imparcialidade, a proteção de direitos fundamentais e o aprimoramento do sistema judicial. Contudo, para
viabilizar a adoção do instituto de forma progressiva e programada pelos tribunais,
é necessário fixar prazo de transição mais dilatado e adequado ao equacionamento
da reorganização do Poder Judiciário nacional.
A atuação do juiz das garantias se encerra com o oferecimento da denúncia ou da
queixa, e não com o recebimento de uma delas, devendo o juiz da instrução ter acesso
aos elementos produzidos no inquérito policial ou no procedimento investigativo criminal. Restringir esse acesso afeta diretamente a independência funcional do magistrado em exercer seu julgamento motivado, em busca da verdade real. Não se pode
presumir que o simples contato com os elementos que ensejaram a denúncia seja apto
a vulnerar a imparcialidade do julgador.
Ademais, a inobservância do prazo previsto em lei não causa a revogação automática
da prisão e o juízo competente deve ser instado a avaliar os motivos que a ensejaram
(1). Não é razoável, proporcional ou obediente ao primado da inafastabilidade da jurisdição, exigir que, em toda e qualquer hipótese, independentemente de suas peculiaridades e dos riscos envolvidos, a prisão seja automaticamente relaxada.
Além de não abranger as infrações de menor potencial ofensivo (CPP/1941, art. 3º-C),
o juiz das garantias também não se aplica: (i) aos tribunais, pois a colegialidade, por
si só, é fato e reforço da independência e da imparcialidade judicial, a justificar a
diferença de tratamento; (ii) aos processos de competência do Tribunal do Júri, pela
mesma lógica do item anterior; e (iii) aos processos criminais de violência doméstica
e familiar, porque a natureza desses casos exige disciplina processual penal específica, que traduza um procedimento mais dinâmico, apto a promover o pronto e efetivo
amparo e proteção da vítima.
Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, ao analisar algumas das
modificações ao CPP/1941, implementadas pela Lei 13.964/2019 (2), julgou parcialmente procedentes as ações para:
I. por maioria, atribuir interpretação conforme ao art. 3º-A do CPP, para
assentar que o juiz, pontualmente, nos limites legalmente autorizados, pode
determinar a realização de diligências suplementares, para o fim de dirimir
dúvida sobre questão relevante para o julgamento do mérito;
II. por maioria, declarar a constitucionalidade do caput do art. 3º-B do CPP,
e, por unanimidade, fixar o prazo de doze meses, a contar da publicação
da ata do julgamento, para que sejam adotadas as medidas legislativas e administrativas necessárias à adequação das diferentes leis de organização judiciária, à efetiva implantação e ao efetivo funcionamento do juiz das
garantias em todo o País, tudo conforme as diretrizes do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) e sob a supervisão dele. Esse prazo poderá ser prorrogado
uma única vez, por no máximo doze meses, devendo a devida justificativa
ser apresentada em procedimento realizado junto ao CNJ;
III. por unanimidade, declarar a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 20 da Lei 13.964/2019, quanto à fixação do prazo de trinta
dias para a instalação dos juízes das garantias;
IV. por unanimidade, atribuir interpretação conforme aos incisos IV, VIII e
IX do art. 3º-B do CPP, para que todos os atos praticados pelo Ministério
Público, como condutor de investigação penal, se submetam ao controle
judicial (HC 89.837/DF) e fixar o prazo de até noventa dias, contados da
publicação da ata do julgamento, para os representantes do Parquet
encaminharem, sob pena de nulidade, todos os PIC e outros procedimentos de investigação criminal, mesmo que tenham outra denominação, ao
respectivo juiz natural, independentemente de o juiz das garantias já ter
sido implementado na respectiva jurisdição;
V. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao inciso VI do art. 3º-B
do CPP, para prever que o exercício do contraditório será preferencialmente
em audiência pública e oral;
VI. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao inciso VII do art.
3º-B do CPP, para estabelecer que o juiz pode deixar de realizar a audiência
quando houver risco para o processo, ou diferi-la em caso de necessidade;
VII. por maioria, declarar a inconstitucionalidade do inciso XIV do art. 3º-B
do CPP, e atribuir interpretação conforme para assentar que a competência
do juiz das garantias cessa com o oferecimento da denúncia;
VIII. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao § 1º do art. 3º-B
do CPP, para estabelecer que o preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz das garantias, no prazo de 24 horas, salvo impossibilidade fática, momento em que
se realizará a audiência com a presença do ministério público e da defensoria pública ou de advogado constituído, cabendo, excepcionalmente, o
emprego de videoconferência, mediante decisão da autoridade judiciária
competente, desde que este meio seja apto à verificação da integridade
do preso e à garantia de todos os seus direitos;
IX. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao § 2º do art. 3º-B
do CPP, para assentar que: (a) o juiz pode decidir de forma fundamentada,
reconhecendo a necessidade de novas prorrogações do inquérito, diante de elementos concretos e da complexidade da investigação; e (b) a inobservância do prazo previsto em lei não implica a revogação automática
da prisão preventiva, devendo o juízo competente ser instado a avaliar os
motivos que a ensejaram, nos termos da ADI 6.581/DF;
X. por unanimidade, atribuir interpretação conforme à primeira parte do
caput do art. 3º-C do CPP, para esclarecer que as normas relativas ao juiz
das garantias não se aplicam às seguintes situações: (a) processos de competência originária dos tribunais, os quais são regidos pela Lei 8.038/1990;
(b) processos de competência do tribunal do júri; (c) casos de violência
doméstica e familiar; e (d) infrações penais de menor potencial ofensivo;
XI. por maioria, declarar a inconstitucionalidade da expressão “recebimento
da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código” contida na
segunda parte do caput do art. 3º-C do CPP, e atribuir interpretação conforme para assentar que a competência do juiz das garantias cessa com
o oferecimento da denúncia;
XII. por maioria, declarar a inconstitucionalidade do termo “Recebida” contido no § 1º do art. 3º-C do CPP, e atribuir interpretação conforme ao dispositivo para assentar que, oferecida a denúncia ou queixa, as questões
pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento;
XIII. por maioria, declarar a inconstitucionalidade do termo “recebimento”
contido no § 2º do art. 3º-C do CPP, e atribuir interpretação conforme ao
dispositivo para assentar que, após o oferecimento da denúncia ou queixa,
o juiz da instrução e julgamento deverá reexaminar a necessidade das
medidas cautelares em curso, no prazo máximo de dez dias;
XIV. por unanimidade, declarar a inconstitucionalidade, com redução de
texto, dos §§ 3º e 4º do art. 3º-C do CPP, e atribuir interpretação conforme
para entender que os autos que compõem as matérias de competência
do juiz das garantias serão remetidos ao juiz da instrução e julgamento;
XV. por unanimidade, declarar a inconstitucionalidade do caput do art.
3º-D do CPP;
XVI. por unanimidade, declarar a inconstitucionalidade formal do parágrafo
único do art. 3º-D do CPP;
XVII. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao art. 3º-E do CPP,
para assentar que o juiz das garantias será investido, e não designado,
conforme as normas de organização judiciária da União, dos estados e
do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente
divulgados pelo respectivo tribunal;
XVIII. por unanimidade, declarar a constitucionalidade do caput do art.
3º-F do CPP;
XIX. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao parágrafo único
do art. 3º-F do CPP, para assentar que a divulgação de informações sobre
a realização da prisão e a identidade do preso pelas autoridades policiais,
Ministério Público e magistratura deve assegurar a efetividade da persecução
penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão;
XX. por maioria, atribuir interpretação conforme ao caput do art. 28 do CPP,
para assentar que, ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito policial
ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do
Ministério Público submeterá sua manifestação ao juiz competente e comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar
os autos para o Procurador-Geral ou para a instância de revisão ministerial,
quando houver, para fins de homologação, na forma da lei;
XXI. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao § 1º do art. 28
do CPP, para assentar que, além da vítima ou de seu representante legal,
a autoridade judicial competente também poderá submeter a matéria à
revisão da instância competente do órgão ministerial, caso verifique patente
ilegalidade ou teratologia no ato do arquivamento;
XXII. por unanimidade, declarar a constitucionalidade dos arts. 28-A, caput,
III, IV e §§ 5º, 7º e 8º do CPP;
XXIII. por maioria, declarar a inconstitucionalidade do § 5º do art. 157 do CPP;
XXIV. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao caput do art. 310
do CPP, para assentar que o juiz, em caso de urgência e se o meio se revelar idôneo, poderá realizar a audiência de custódia por videoconferência;
XXV. por unanimidade, atribuir interpretação conforme ao § 4º do art. 310
do CPP, para assentar que a autoridade judiciária deverá avaliar se estão
presentes os requisitos para a prorrogação excepcional do prazo ou para
sua realização por videoconferência, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva; e
XXVI. por unanimidade, fixar a seguinte regra de transição: quanto às
ações penais já instauradas no momento da efetiva implementação do juiz
das garantias pelos tribunais, a eficácia da lei não acarretará qualquer
modificação do juízo competente." (Grifo nosso).
Questão
Considerando o entendimento do STF, assinale a alternativa
correta:
(A) A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações
penais, exceto as contravenções penais, e cessa com o
oferecimento da denúncia ou queixa.
(B) O juiz que atuar como juiz das garantias na fase de investigação
ficará impedido de funcionar no processo em razão do
princípio da imparcialidade.
(C) Compete ao juiz das garantias assegurar ao investigado e ao
seu defensor o acesso a todos os elementos informativos e
provas produzidas na investigação criminal, salvo quanto às
diligências em andamento.
(D) Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das
garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à
disposição das partes, e não serão apensados aos autos do
processo enviados ao juiz da instrução e julgamento,
ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis,
medidas de obtenção de provas ou antecipação de provas.
(E) Caberá ao juiz das garantias assegurar o contraditório e a
ampla defesa, necessariamente em audiência pública e oral,
caso decida prorrogar prisão provisória ou outra medida
cautelar, substituí-las ou revogá-las.
Gabarito: C
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