O crime previsto no art. 56, caput da Lei n. 9.605/1998 é de perigo abstrato, sendo dispensável a produção de prova pericial para atestar a nocividade ou a periculosidade dos produtos transportados

Julgado cobrado na primeira fase do TJ/RJ para o cargo de Juiz Substituto, realizada em 2025.

 

Tese fixada pelo STJ (informativo nº 613 do STJ)

O crime previsto no art. 56, caput da Lei n. 9.605/1998 é de perigo abstrato, sendo dispensável a produção de prova pericial para atestar a nocividade ou a periculosidade dos produtos transportados, bastando que estes estejam elencados na Resolução n. 420/2004 da ANTT.

 

Ementa 

RECURSO ESPECIAL. CRIME AMBIENTAL. TRANSPORTE DE PRODUTOS TÓXICOS, NOCIVOS OU PERIGOSOS. ART. 56, CAPUT, DA LEI N. 9.605/1998. LEI PENAL EM BRANCO. RESOLUÇÃO DA ANTT N. 420/2004. NORMA DE INTEGRAÇÃO. BEM JURÍDICO TUTELADO. MEIO AMBIENTE E INCOLUMIDADE PÚBLICA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. PERÍCIA. PRESCINDIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.

1. A conduta ilícita prevista no art. 56, caput, da Lei n. 9.605/1998 é norma penal em branco, cuja complementação depende da edição de outras normas, que definam o que venha a ser o elemento normativo do tipo "produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde pública ou ao meio ambiente". No caso específico de transporte de tais produtos ou substâncias, o Regulamento para o Transporte Rodoviário de Produtos Perigosos (Decreto n. 96.044/1988) e a Resolução n. 420/2004 da Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, constituem a referida norma integradora, por inequivocamente indicar os produtos e substâncias cujo transporte rodoviário é considerado perigoso.

2. Por outro lado, a conduta ilícita prevista no art. 56, caput, da Lei n. 9.605/1998 é de perigo abstrato. Não é exigível, pois, para o aperfeiçoamento do crime, a ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na conduta de quem produz, processa, embala, importa, exporta, comercializa, fornece, transporta, armazena, guarda, tem em depósito ou usa produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos. 

3. Embora seja legítimo aspirar a um Direito Penal de mínima intervenção, não pode a dogmática penal descurar de seu objetivo de proteger bens jurídicos de reconhecido relevo, assim entendidos, na dicção de Claus Roxin, como "interesses humanos necessitados de proteção penal", qual a proteção ao meio ambiente e à incolumidade pública.

Não se pode, assim, esperar a concretização de danos, ou exigir a demonstração de riscos concretos para a punição de condutas que representam potencial produção de danos ao ecossistema e, por consequência, a pessoas indeterminadas.

4. O eventus periculi, advindo da prática de quem incorre em uma das condutas previstas no art. 56, caput, da Lei n. 9.605/1998, portanto, é presumido e, por conseguinte, prescinde da realização de perícia para comprovar a nocividade da substância ou produto, bastando, para tanto, que o "produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva para a saúde humana ou o meio ambiente" esteja declinado ex lege, ou seja, no caso, que esteja elencado na Resolução n. 420/04 da ANTT.

5. Recurso especial conhecido e provido, para restabelecer a condenação dos recorridos e determinar ao Tribunal de origem que reexamine a apelação defensiva, partindo da premissa de que a mera ausência de prova pericial não constitui óbice à manutenção do édito condenatório.

(REsp n. 1.439.150/RS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/10/2017, DJe de 16/10/2017.)

  

Legislação (Lei n. 9.605/1998)

Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

 

Questão da Vunesp

Tendo em conta as situações hipotéticas e considerando a jurisprudência dos Tribunais Superiores, assinale a alternativa correta. 

(A) Tícia, por submeter a filha a intenso sofrimento físico como forma de castigo, incide no crime de tortura-castigo, previsto no artigo 1, do inciso II, da Lei no 9.455/97, agravado pela circunstância de ter sido praticado em detrimento de descendente. 

(B) Mévia, mulher trans, vítima de violência praticada em âmbito doméstico, não está protegida pela Lei Maria da Penha, já que o critério estabelecido da definição de mulher é o biológico. 

(C) Tício, por dirigir com a habilitação suspensa em decorrência de penalidade administrativa, incorre no crime de violar a suspensão para dirigir, previsto no artigo 307 do Código de Trânsito Brasileiro. 

(D) Tício, pelo crime de roubo praticado em detrimento de Caio, de 61 anos, será punido sem a incidência da agravante genérica, prevista no artigo 61, II, h, do CP, se restar comprovado que a condição de idoso da vítima em nada facilitou a prática delitiva. 

(E) Seprônio, tendo transportado substância considerada tóxica à saúde, em desacordo às exigências estabelecidas, sem que perícia ateste a periculosidade do produto, não incorrerá no crime previsto no artigo 56 da Lei no 9.605/98.

Gabarito: A