É inconstitucional norma de Constituição estadual, oriunda de iniciativa parlamentar, que disciplina matéria atinente à eleição dos órgãos diretivos do tribunal de justiça local

Julgado cobrado na prova do ENAM - 2025.1.


Síntese da decisão (Informativo 1.145 do STF)

"É inconstitucional — por violar o princípio da separação dos Poderes (CF/1988, art. 2º), a autonomia dos tribunais (CF/1988, arts. 96, I, “a”, e 99), a reserva de lei complementar nacional (CF/1988, art. 93, caput) e a reserva de iniciativa (CF/1988, art. 96, II, “d”) — norma de Constituição estadual, oriunda de iniciativa parlamentar, que disciplina matéria atinente à eleição dos órgãos diretivos do tribunal de justiça local."


Ementa 

Ação direta de inconstitucionalidade. Emenda Constitucional nº 67 à Constituição do Estado de Mato Grosso, de 26 de dezembro de 2013. Processo legislativo deflagrado por parlamentar. Norma que disciplina o colégio de eleitores dos órgãos diretivos do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Inconstitucionalidade formal. Vício de iniciativa. Artigo 96, inciso II, alínea d, da Constituição Federal. Organização judiciária. Competência privativa do Chefe do Poder Judiciário local. Artigo 93, caput, da CF/88. Tema afeto à magistratura. Necessidade de lei complementar nacional. Inconstitucionalidade material. Artigo 96, inciso I, alínea a, da Constituição Federal. Competência privativa dos tribunais para eleger seus órgãos diretivos. Violação do princípio da separação dos poderes. Procedência do pedido. Modulação dos efeitos. 1. O art. 96, inciso II, alínea d, da Constituição Federal dispõe que compete ao tribunal de justiça local a reserva de iniciativa para deflagrar o processo legislativo que tenha por objeto alterar sua organização ou seu funcionamento. Inconstitucionalidade formal verificada. Precedentes. 2. A norma impugnada, de iniciativa parlamentar, ao dispor que terão direito a voto “todos os magistrados em atividade, de primeiro e segundo graus, da respectiva jurisdição”, claramente interfere na organização relativa às eleições para os órgãos diretivos do TJMT, caminhando, dessa forma, de encontro ao que foi disciplinado pela Constituição Federal. 3. Temas próprios do Estatuto da Magistratura ' como a definição do colégio de eleitores dos órgãos diretivos dos tribunais ', somente podem ser positivados por lei complementar nacional, jamais por lei estadual (lato sensu), conforme determina o art. 93, caput, da Constituição Federal. 4. Por força do disposto no art. 96, inciso I, alínea a, da Constituição Federal, compete privativamente aos tribunais (entendidos aqui como órgãos colegiados) eleger seus órgãos diretivos. Inconstitucionalidade material verificada. Precedente: ADI nº 2.012/SP. 5. Configurou-se, no caso, a inconstitucionalidade material da emenda à Constituição Estadual de iniciativa parlamentar que, a pretexto de assegurar a efetiva democracia no processo de escolha dos dirigentes dos tribunais, estabeleceu novo universo de eleitores, em desrespeito ao que prevê a Constituição Federal (art. 96, inciso I, alínea a, da CF). Invasão em matéria de competência do Poder Judiciário e violação do princípio da separação dos poderes. 6. Ação direta de inconstitucionalidade da qual se conhece e pedido julgado procedente para se declarar a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 67 à Constituição do Estado de Mato Grosso, de 26 de dezembro de 2013. 7. Modulação dos efeitos da decisão, a fim de que incidam a partir da publicação da ata de julgamento, assegurando-se a higidez das eleições dos órgãos diretivos realizadas durante a vigência da norma declarada inconstitucional.

(ADI 5303, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 12-08-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 27-08-2024  PUBLIC 28-08-2024) Grifo nosso.


Questão da FGV

Uma Constituição Estadual foi modificada, por iniciativa parlamentar, e passou a dispor que compete, privativamente, ao Tribunal de Justiça eleger seu órgão diretivo por voto de todos os magistrados em atividade, de primeiro e segundo graus, da respectiva jurisdição, para um mandato de dois anos, permitida uma recondução. 

Por sua vez, uma lei que trata da Magistratura, datada de 1979, expressa que os Tribunais elegerão aqueles que ocuparão os cargos de direção. O mandato seria de dois anos, proibida a reeleição. 

De acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o pensamento do Supremo Tribunal Federal, assinale a afirmativa correta. 

(A) O tema pode ser veiculado por meio de emenda constitucional de iniciativa parlamentar, porque se trata de processo legislativo de aprovação mais rigorosa e com forte pedigree democrático. 

(B) A eleição dos órgãos diretivos é assunto que diz respeito ao Estatuto da Magistratura e, sendo a eleição nacional, a espécie normativa deve ser a lei ordinária editada pelo Congresso Nacional. 

(C) A amplitude do colégio eleitoral para fins de eleições dos órgãos diretivos está resguardada no princípio democrático e é tema de assento constitucional, devendo ser veiculada por norma constitucional estadual. 

(D) Compete privativamente aos Tribunais, assim entendidos como órgãos colegiados, a eleição de seus órgãos diretivos, o que exclui a possibilidade de inclusão, por norma constitucional estadual, de Juízes no colégio eleitoral. 

(E) Por ser oriunda do período ditatorial, a mencionada Lei da Magistratura não foi recepcionada pela Constituição de 1988, havendo um vácuo legislativo sobre a eleição dos órgãos diretivos a permitir o trato do tema na seara constitucional estadual.

Gabarito: D


Dispositivos da Constituição da República

"Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:"

"Art. 96. Compete privativamente:

I - aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;

(...)

II - ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169: 

(...)

d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;"